São paisagens quase sempre áridas. Quando não pela
inclemência do sol canicular, pela marca natural de seus homens. Homens
calados, macambúzios, sofrendo no silêncio a própria dor de existir. "Daí por
que o sertanejo fala pouco: / as palavras de pedra ulceram na boca / e no
idioma pedra se fala doloroso", ensina João Cabral de Melo Neto, certamente um
dos mais perfeitos desses tantos cronistas que tomam para si a árdua tarefa de
desvendar o povo do silêncio.
No livro Tarde de Chuva, Luiz Eudes toma-se do ofício de
escrevinhador para botar mais uma colher neste vasto e espesso angu que é a
alma do sertanejo. Ele fala do Junco, e não de Sátiro Dias, como pode pensar um
leitor desavisado. Sua prosa vem de tempos pretéritos, onde a maior das
tecnologias escudava-se numa câmera fotográfica que ainda carecia de filmes a
serem rebobinados. Montados em cavalos ou caminhando a pé, homens e mulheres
preservam medos e sentimentos que herdaram de avós longínquos, e guardam estas
tradições como tesouros, botijas que desenterram de um chão muito antigo.
A persistência em falar de antigas crenças e tradições
imemoriais transforma a prosa de Luiz Eudes num cantar moderno, contemporâneo.
Ele diz de coisas passadas, é certo, mas igualmente acontecências que continuam
a existir, não como depoimento de um passado, e sim como sentimento profundo do
hoje. Os presépios, os amores infantis, as assombrações, tudo ainda está nas
paredes do Junco e na alma dolorida de quem lá ficou.
Algo se destaca nessas narrativas, o riso discreto, o humor
suave, sem gargalhadas, tão sertão. Toda e qualquer sociedade tem seus loucos,
seus desvairados, seus místicos, seus desastrados, seus oportunistas. E Luiz
poderia falar de qualquer cidade, enfim. No entanto prefere permanecer com os
pés no sertão, onde toda essa gente deita um tanto de alegria na fortaleza
natural dos dias.
São contos de saudade, sim, mas o autor fala de um cotidiano que acontece, que continua impregnado em sua pele, e resvala nele todas as horas do presente. E diz isso de maneira poética, com o lirismo que o sol quente e luminoso não conseguiu apagar. Enfim, um texto que se lê como quem prova de todos os sabores da terra, algo amargo, mas que pacifica todos os rudes sentimentos.
Quem nasceu e viveu numa cidadezinha perdida no meio da
poeira nordestina, sabe bem do que fala Luiz Eudes. Ele fala de almas que
embalam sonhos, desejos de seguir em frente. (Mauricio Melo Junior-jornalista)