A tendência é que a candidatura
de Hugo Motta (Republicanos-PB), apoiada por Lira e pela maioria das
bancadas, saia vencedora do pleito.
Lira foi eleito presidente da
Câmara em fevereiro de 2021, no início do terceiro ano da gestão de Jair
Bolsonaro (PL), que o apoiou. Na ocasião, o alagoano recebeu 302 votos,
contra 145 do principal adversário àquela altura: o deputado e
presidente nacional do MDB, Baleia Rossi (SP).
No decorrer dos últimos quatro
anos, Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), lidaram com
crises como a pandemia de Covid-19, o impasse sobre as emendas
parlamentares e os atos de 8 de janeiro de 2023.
Pandemia e Bolsonaro
Lira assumiu a liderança da
Câmara durante o auge da pandemia de Covid-19 no Brasil, quando o número diário
de óbitos ultrapassava milhares de mortes e a vacinação contra a doença
progredia lentamente.
Neste contexto, Lira se
comprometeu, em nome da Câmara, a priorizar o combate ao coronavírus, a busca
pela universalização das vacinas e as pautas de recuperação econômica do país.
Para além da crise sanitária, a
gestão Bolsonaro buscava, à época, construir uma coalizão no Legislativo, que
permitisse maior governabilidade. Foi então que, na avaliação do cientista
político Eduardo Grin, professor da Fundação Getulio Vargas em São Paulo
(FGV-SP), Lira enxergou uma oportunidade na situação.
"O papel que os dois [Lira e
Pacheco] tiveram, sobretudo Lira, foi de aproveitar as oportunidades de um
governo que não tinha condições de construir uma coalizão no Congresso. A
relação dos dois com Bolsonaro, no auge da pandemia, foi não criar nenhum obstáculo
ao governo e se beneficiar num contexto em que Bolsonaro estava muito preso a
sua base ideológica", disse Grin à CNN.
Emendas parlamentares
Ao longo de todo o mandato de
Lira, um tema central de tensão entre os Três Poderes ? principalmente entre
Legislativo e Judiciário ? foi o das emendas parlamentares.
As emendas são instrumentos
utilizados por deputados e senadores que permitem que alterações sejam feitas
no Orçamento. Elas podem ser usadas, por exemplo, por parlamentares para enviar
recursos aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios.
O ministro Flávio Dino, do
Supremo Tribunal Federal (STF), é relator de diferentes ações na Corte que
contestam a execução das emendas, cujos valores cresceram substancialmente nos últimos anos.
"A curva de crescimento das
emendas é assombrosa. Por essa lógica, o Congresso passou a ter muito mais
poderes", analisou Grin.
A cientista política e também
professora da FGV-SP, Graziella Testa tem a mesma visão sobre o tema.
"A construção de governabilidade,
que acontecia por meio dos líderes partidários, foi deslocada para o presidente
da Mesa [Diretora da Câmara]. A gente saiu de um período de grande estabilidade
da forma como os Poderes se relacionavam. Tivemos mudanças significativas no
período entre 2015 e 2017, cujos reflexos vemos agora", explicou a
especialista.
"Podemos dizer que falta uma
maior responsabilização do Legislativo pela função que ele ganha, sobretudo as
prerrogativas orçamentárias. Então, se tem novas prerrogativas, que se tenha
novas prestações de contas e novas formas de se tornar responsável por aquilo
que agora se domina", prosseguiu Testa.
A polêmica em torno do tópico
ganhou um novo capítulo ao final de 2024, quando Dino suspendeu o pagamento de R$ 4,2 bilhões em emendas
parlamentares. Ele determinou ainda que a Polícia Federal (PF) abrisse um
inquérito para investigar o caso.
Eleição presidencial
Em 2022, Lira acompanhou de perto
a disputa entre o então chefe do Executivo Jair Bolsonaro (PL), que buscava a
reeleição, e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tentava retornar ao Palácio do
Planalto para um terceiro mandato como presidente da República.
Em meio a acusações por parte de
Bolsonaro e apoiadores, que colocavam em cheque a lisura da eleição
presidencial de 2022, Lira reconheceu rapidamente a vitória de Lula, sendo o
primeiro chefe de órgão dos Três Poderes a se pronunciar. Pacheco reconheceu na sequência.
"Lula tinha legitimidade junto à
sociedade brasileira muito grande. Seria, no mínimo, uma enorme inabilidade
política os dois [Lira e Pacheco] não se colocarem à disposição de conversar
com o presidente eleito", citou o cientista político Eduardo Grin.
8 de janeiro
Uma semana após a posse de Lula,
no entanto, Lira foi surpreendido pelas invasões das sedes dos Três Poderes, em
Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023.
Naquele domingo, os prédios da
Câmara, do Senado, do Supremo Tribunal Federal (STF) e o Palácio do Planalto
foram depredados.
Embora tenha condenado os atos
antidemocráticos, Lira não participou dos eventos promovidos pelo governo
federal, em 2024 e 2025, para relembrar o episódio.
Mais de 310 pessoas foram condenadas pelas invasões até o momento.
Em seminário de celebração dos 35
anos da Constituição Federal, em outubro de 2023, Lira declarou que a Carta
Magna serviu de guia para o combate aos criminosos que, segundo ele, queriam
"vilipendiar" a democracia.
"Foi sob a guia da Constituição
que refutamos veementemente a tentativa daqueles que invadiram este prédio com
o intuito de vilipendiar a nossa democracia. E foi sob amparo da mesma
Constituição que, no dia seguinte, com muito esforço e muita emoção, estávamos
reunidos para reafirmar que a Casa onde o povo se faz representado permanece de
pé", disse Lira na ocasião.
Reeleição e sucessão
Em fevereiro de 2023, Lira foi
reconduzido à Presidência da Câmara. Desta vez, com votação recorde. Foram 464 votos dos 513
possíveis. Nenhum outro deputado federal teve mais votos que Lira desde a
redemocratização.
A reeleição do parlamentar ao
comando da Casa contou com um amplo arco de alianças que abrangeu desde o
PL de Bolsonaro ao PT de Lula.
Impedido de disputar um terceiro
mandato, Lira oficializou, em outubro passado, apoio ao deputado
paraibano Hugo Motta, do Republicanos, para sucedê-lo na Presidência da
Casa.
A candidatura de Motta foi
viabilizada pela desistência de Marcos Pereira (SP), presidente nacional do
Republicanos, que ensaiava concorrer ao cargo, mas desistiu em favor do colega
de partido.
Retorno ao "chão de fábrica"
Homenageado por colegas em sessão
em dezembro de 2024, Lira fez questão de ressaltar aos colegas que não estava
encerrando um ciclo ao deixar a presidência da Casa.
Nós sempre nos renovamos.
Podemos voltar para onde eu sempre gostei de atuar, que é no chão de fábrica,
como eu sempre chamo, sem nenhum tipo de problema, como qualquer outra
situação. Então vamos vivendo sem planejar e sem criar expectativas. É a maneira
do nordestino viver feliz. É sem criar expectativas, matando um leão por dia.
Ruim é quando temos que matar o mesmo leão todo dia, mas até isso fazemos. (Arthur
Lira).
Contudo, o futuro político de
Lira e Pacheco segue indefinido. Segundo aliados próximos de ambos afirmaram à CNN, a
dupla ainda não definiu os planos para 2025 e aguardam a consolidação do
cenário político nacional para tomar uma decisão.
Apesar de não ter recebido
convite oficial para integrar o ministério de Lula, alguns aliados de Lira
defendem que ele seja chamado para manter uma relevância política.
Todavia, Lira enfrenta forte
resistência no Palácio do Planalto, principalmente devido ao apoio a Bolsonaro
nas eleições de 2022 e uma proximidade com a oposição.
Para o cientista político Eduardo
Grin, Lira pode, sim, ser contemplado com uma eventual reforma ministerial
promovida por Lula.
"Lira está ponderando ganhos e
perdas. Acredito que ele buscaria um cargo mais vinculado ao Parlamento, como
as Relações Institucionais [ocupado atualmente por Alexandre Padilha]",
ponderou o especialista.
Já Graziella Testa vê espaços a
serem ocupados por Lira e Pacheco na Esplanada dos Ministérios, mas alerta para
o real ganho do governo com essas movimentações.
"Existem espaços a serem ocupados
por Pacheco e Lira, mas acho que seria improvável que a ocupação ministerial
desses atores políticos rendesse dividendos positivos em termos de
governabilidade para o presidente da República", concluiu. (Lucas Schroederda
CNN , São Paulo).
Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados