A mesa "A comunicação como questão estratégica" faz parte do
seminário "Os desafios da comunicação nas administrações públicas", que
acontece desde sexta-feira (29). O evento está em sua terceira edição e é organizado
pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.
Um dos debatedores, o diretor e editor-chefe do Le
Monde Diplomatique Brasil, Silvio Caccia Bava, defendeu a urgência de
plataformas críticas e que apresentem narrativas diferentes aquelas impostas
pelos veículos hegemônicos. Segundo o jornalista, o acesso à pluralidade de
vozes e perspectivas é fundamental para o fortalecimento da organização social.
"Se não tivermos um conjunto de órgãos de comunicação
contra-hegemônicos alertando a população sobre a perda de direitos, não temos
como subsidiar as mobilizações sociais e as lutas por direitos", afirmou Bava.
Ele ainda lembrou a obra "Manufacturing Consent" (1994), de Noam Chomky e Edward Herman. De acordo com o estudo do livro, os
meios de comunicação de massa têm atuado na defesa de interesses do estado e da
atividade privada, e não da população. Os veículos contra-hegemônicos seriam
uma alternativa a esse cenário.
Já o publicitário Chico Malfitani trouxe para o debate a
importância do marketing e da publicidade. Segundo ele, sob o governo de Jair
Bolsonaro (PSL), é preciso que a coerência do campo progressista brasileiro
passe também pela unidade do campo da comunicação e disseminação de ideias.
"Vivemos em uma sociedade de comunicação de massa na qual as
ideias neoliberais estão tomando conta da população. Temos que ter uma
comunicação clara e unitária na esquerda", afirmou Malfitani.
Ele lembrou o êxito dos grupos da direita política ao
levarem para as ruas, desde as mobilizações de 2013, a bandeira da "anticorrupção" como unidade narrativa; e afirmou que a saída para a esquerda
não é apenas contrapor essa narrativa, mas sim disseminar suas próprias
propostas com um guarda-chuva de temas, como distribuição de renda, defesa do
petróleo e geração de empregos.
10 anos da Confecom
Presente no debate, a jornalista Tereza Cruvinel, primeira
presidente da Empresa
Brasil de Comunicação (EBC), lembrou os recém-completados dez anos da
Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Em 2009, o evento possibilitou
o debate entre sociedade civil, governo e empresariado sobre as mudanças
necessárias no campo da comunicação brasileira.
Da Confecom, saíram centenas de propostas aprovadas como
prioritárias, e o compromisso de um novo marco regulatório das comunicações,
mais democrático e plural. No Brasil, a radiodifusão permanece regida por uma
legislação da época da Ditadura Militar (1964 - 1985), o Código Brasileiro de
Telecomunicações de 1962.
Apesar de incorporadas pelas agendas de reivindicações de
movimentos sociais e populares, as demandas formuladas na Confecom não foram
implementadas pelo governo federal, mesmo no decorrer de governos progressistas - cenário ao qual Cruvinel é crítica.
"A mudança no panorama da radiodifusão brasileira é
fundamental para discutirmos a colonização de mentes", afirmou a jornalista. "Para que se tenha uma democracia de fato, precisamos de cidadãos bem
informados e, quando temos um pequeno grupo controlando a difusão de
informações para a sociedade, isso é impossível", completou.
Cruvinel ainda destacou avanços pontuais, como a aprovação
do Marco Regulatório da Internet e da Lei
de Proteção de Dados (LGPDP), mas destaca que a uma mudança nos oligopólios
de mídia do país só será possível se associada à luta por mudança política, que
tem seu ponto alto nas eleições presidenciais de 2022.
Consórcio Nordeste
Fernando Morais, escritor e fundador do blog Nocaute, saudou
a iniciativa do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável do
Nordeste (Consórcio Nordeste) como uma esperança nesse cenário. "É uma força
política", caracterizou.
Além de uma parceria econômica e política entre nove estados
da região Nordeste, o Consórcio também lançou
recentemente o programa de rádio "Giro Nordeste". Com a objetivo de
aumentar a integração e a difusão de informação regional, o programa reúne
notícias dos estados nordestinos e é retransmitido em diversas emissoras. Uma
nova parceria de comunicação está sendo formulada, mas dessa vez na
televisão.
Para Morais, o bloco é essencial para o combate à falta de
informação na região. "Mais do que nunca, é hora de juntar forças", defendeu o
escritor.
Nesse sentido, o coordenador-geral da TVT (TV dos
Trabalhadores) e da Rede Brasil Atual, Paulo Salvador, chamou atenção para a
necessidade de pensar não somente o uso mídias digitais, mas também o rádio e a
televisão. A TVT, por exemplo, é a primeira emissora de televisão outorgada a
um sindicato de trabalhadores no país, no ano de 2010.
Salvador ainda destacou o financiamento coletivo das mídias
alternativas, como muitos veículos têm feito atualmente. Segundo ele, essa é
uma forma de fortalecer democraticamente o campo da comunicação no Brasil.
A mesa contou com mediação de Altamiro Borges, presidente do
Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, e Kiko Nogueira,
diretor-executivo do Diário do Centro do Mundo (DCM). O debate completo está
disponível aqui.
(Mayara Paixão).
Foto: Divulgação/Ascom