Frigoríficos investigados na Operação Carne Fraca usavam
produtos químicos para [maquiar] carne vencida. As empresas também injetavam
água para aumentar o peso dos produtos e, em alguns casos, foi constatada ainda
falta de proteína na carne. Os detalhes foram passados pelo delegado da Polícia
Federal Maurício Moscardi Grillo em coletiva de imprensa nesta sexta-feira
(17).
[Eles usavam ácidos e outros produtos químicos para poder
maquiar o aspecto físico do alimento. Usam determinados produtos cancerígenos
em alguns casos para poder maquiar as características físicas do produto
estragado, o cheiro], disse Moscardi.
No caso da falta de proteína, o delegado explicou que havia
substituição. [Foi trocada por fécula de mandioca ou proteína da soja, que é
muito mais barata, mais fácil de substituir.]
O delegado afirmou que nem mesmo os fiscais envolvidos, que
costumavam ganhar carnes dos proprietários como benefício, estavam aguentando a
má qualidade dos produtos. [Eles comentavam entre si que não estava mais dando
para receber], disse.
Esquema
A operação apura o envolvimento de fiscais do Ministério da
Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa) em um esquema de liberação de
licenças e fiscalização irregular de frigoríficos. A denúncia foi feita por um
deles.
Segundo a polícia, a Carne Fraca] é a maior operação já
realizada pela PF no país. Pela manhã, funcionários do ministério foram
detidos.
As investigações chegaram às principais empresas do setor,
entre elas a BRF Brasil, que controla marcas como Sadia e Perdigão, e a JBS,
que detém Friboi, Seara, Swift, entre outras marcas.
Gravações telefônicas apontam que frigoríficos vendiam carne
vencida tanto no mercado interno, quanto para exportação.
Em contato com o G1, a JBS afirmou que não tem informação de
que algum executivo seu foi preso e informou que não há operação da PF na
empresa. A reportagem tenta contato com os demais citados pela Polícia Federal.
Segundo as investigações, o esquema no Paraná era comandado
pelo ex-superintendente regional do Mapa, Daniel Gonçalves Filho, e pela chefe
do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Dipoa), Maria do
Rocio Nascimento, que trabalham em Curitiba.
Na casa do atual superintendente regional do Mapa, Gil
Bueno, a polícia apreendeu R$ 65 mil nesta manhã. Os três são alvos de prisão
preventiva.
De acordo com informações da Polícia Federal, a investigação
começou porque um fiscal não aceitou ser removido quando descobriu fraudes em
uma das empresas investigadas.
Em sua decisão, o juiz federal Marcos Josegrei da Silva, da
14ª Vara Federal de Curitiba, diz que o envolvimento do Ministério da
Agricultura é [estarrecedor]. [(O ministério) foi tomado de assalto – em ambos
os sentidos da palavra – por um grupo de indivíduos que traem reiteramente a
obrigação de efetivamente servir à coletividade], afirmou.
Carne vencida
Gravações telefônicas obtidas pela Polícia Federal apontam
que vários frigoríficos do país vendiam carne com data de validade vencida
tanto no mercado interno, quanto para exportação.
Entre produtos químicos e produtos fora da validade, há
casos ainda mais [curiosos], como a inserção de papelão em lotes de frango e
carne de cabeça de porco em linguiça.
Diretores e donos das empresas estariam envolvidos
diretamente nas fraudes, que contavam com a ajuda de servidores do Ministério
da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, no Paraná, Goiás e Minas Gerais.
No Paraná. Há ramificações em Londrina, no norte do estado,
e em Foz do Iguaçu, na região oeste do estado. No Rio Grande do Sul, são
cumpridos mandados nas cidades de Gramado e Bento Gonçalves, na serra gaúcha,
segundo apurou o G1 RS.
Em São Paulo, são 18 mandados no total, sendo 8 de busca e
apreensão, 3 de prisão preventiva, 1 de prisão temporária e 6 de condução
coercitiva, todos na capital, de acordo com informações do G1 SP.
Operação nacional
A operação detectou, em quase dois anos de investigação, que
as Superintêndencias Regionais do Ministério da Pesca e Agricultura do Estado
do Paraná, de Minas Gerais e de Goiás atuavam diretamente para proteger grupos
empresariais em detrimento do interesse público.
Mediante pagamento de propina, os agentes públicos suspeitos
atuavam para facilitar a produção de alimentos adulterados, emitindo
certificados sanitários sem qualquer fiscalização efetiva.
Entre as ilegalidades praticadas no âmbito do setor público,
está a remoção de agentes públicos com desvio de finalidade para atender a
interesses dos grupos empresariais.
A conduta permitia a continuidade da ação fraudulenta de
frigoríficos e empresas do ramo alimentício que operavam fora das regras
vigentes.
Em Goiás, o sistema operava de forma parecida com o
paranaense, sendo chefiado pelo chefe local do Dipoa, Dinis Lourenço da Silva.
Em Minas Gerais, o juiz federal Marcos Josegrei da Silva
afirma que as investigações foram insuficientes para aprofundar o tamanho dos
atos de corrupção envolvidos.
Aproximadamente 1,1 mil policiais federais cumprem 27
mandados de prisão preventiva, 11 de prisão temporária, 77 de condução
coercitiva e 194 de busca e apreensão em residências, locais de trabalho dos
investigados e em empresas supostamente ligadas ao grupo criminoso.
As ordens judiciais foram expedidas pela 14ª Vara da Justiça
Federal de Curitiba e estão sendo cumpridas em São Paulo, Distrito Federal,
Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Goiás.
O nome da operação faz alusão à conhecida expressão popular
em sintonia com a própria qualidade dos alimentos fornecidos ao consumidor por
grandes grupos corporativos do ramo alimentício.
Conforme a PF, a expressão popular demonstra uma fragilidade
moral de agentes públicos federais que deveriam zelar e fiscalizar a qualidade
dos alimentos fornecidos a sociedade. (G.1-PR).
(Foto: Mariele Morski/G1)