O Senado aprovou nesta quarta-feira (6) o projeto que
regulamenta direitos dos trabalhadores domésticos (PLS 224/2013). O texto
aprovado pelos senadores retoma o que havia sido aprovado no Senado há cerca de
dois anos, com apenas alguns pontos mudados pela Câmara, como a possibilidade
de dedução de despesas com empregados domésticos no Imposto de Renda. O projeto
segue para sanção da presidente da República.
? Agora sim nós acabamos de fechar a última senzala
brasileira e abolir o ultimo resquício da escravatura ? comemorou o presidente
do Senado, Renan Calheiros, que previu uma maior formalização de empregados
domésticos.
O texto foi elaborado para regulamentar a Emenda
Constitucional 72, promulgada em abril de 2013, resultante da PEC das
Domésticas. Aprovado em julho de 2013 pelo Senado, o projeto seguiu para a
Câmara dos Deputados, onde só foi aprovado em março de 2015, com muitas
mudanças. O projeto voltou ao Senado na forma de um texto alternativo elaborado
pela outra Casa Legislativa (SCD 5/2015).
De acordo com o texto aprovado, empregado doméstico é aquele
que presta serviços remunerados e sem finalidade lucrativa a pessoa ou família,
no âmbito residencial, por mais de dois dias por semana. A jornada regular é de
até 8 horas diárias e 44 semanais.
Contribuição
Entre os pontos alterados pela Câmara e rejeitados pelos
senadores, está o valor da contribuição do empregador para o INSS. A Câmara
havia previsto a contribuição de 12 , mas o Senado retomou a previsão de 8 . A
redução é para compensar a cobrança de 0,8 para um seguro contra acidente e
3,2 para a rescisão contratual. Os 3,2 devem ir para um fundo, em conta
separada, destinado a cobrir a multa de 40 no caso de demissão do empregado
sem justa causa. Essa cobrança, também extinta pela Câmara, foi retomada no
texto do Senado e criticada por alguns senadores.
Lindbergh Farias (PT-RJ), Randolfe Rodrigues (PSOL-AP),
Telmário Mota (PDT-RR), Ataídes Oliveira (PSDB ? TO) e Vanessa Grazziotin
(PCdoB-AM) se manifestaram contra a multa. Um dos argumentos e de que a função
da multa é justamente impedir as demissões sem justa causa, e a cobrança
parcelada desvirtua esse objetivo.
? Ao estabelecermos duas categorias, uma categoria que pode
parcelar o FGTS e todas as outras categorias de trabalhadores que tem que pagar
os 8 de FGTS, ora, para os empregados domésticos vai ter uma flexibilidade,
uma possibilidade maior para demissão ? argumentou Randolfe.
Além disso, a multa volta para o empregador em caso de
demissão com justa causa, o que poderia, segundo críticos da mudança, levar a
uma briga pelo dinheiro.
Ana Amélia (PP-RS), relatora do texto pelas comissões de
Assuntos Sociais (CAS) e de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e Romero
Jucá (PMDB-RR), que foi relator do texto na comissão mista de Consolidação das
Leis, defenderam a multa parcelada. Para eles, é como uma poupança para que o
empregador possa arcar com a multa, já que as famílias não têm a mesma
estrutura e os mesmos recursos das empresas.
? É dinheiro do bolso do empregador. É dinheiro dele que vai
ser pago para formar uma poupança ou fundo, o nome que queiram dar, para que na
hora de uma demissão ele receba, ele tenha atenuado, diluído aquele pagamento
da multa dos 40 sobre o FGTS ? disse Ana Amélia.
A mudança, aprovada pelo Plenário, recebeu elogios de
parlamentares como Ronaldo Caiado (DEM-GO) e José Agripino (DEM-RN). Agripino
elogiou a sintonia entre Jucá e Ana Amélia, que levou ao texto final. A senador
Lúcia Vânia (PSDB-GO) defendeu a sensibilidade da relatora com relação ao texto.
Previdência
O valor da contribuição do empregador ao INSS era um ponto
polêmico porque o governo estima uma perda de R$ 700 milhões ao ano com a
redução. O líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), se mostrou
preocupado com esse ponto do texto. Segundo Jucá, no entanto, o cálculo está
errado porque há uma expectativa de maior formalização, o que aumentaria o
valor arrecadado pelo governo.
? Vão me dizer: não, mas aí o Governo está perdendo receita,
o Governo está abrindo mão de R$ 700 milhões. Desculpem-me, mas é conversa.
Hoje, 1,5 milhão de trabalhadores domésticos pagam INSS e, com essa
regulamentação, oito milhões de trabalhadores domésticos pagarão INSS. Vai
aumentar a arrecadação do Governo ? calculou Jucá.
Além disso, o senador argumentou que vários trabalhadores
domésticos informais acabam, na velhice, recebendo benefícios do governo por
meio da Lei Orgânica de Assistência Social por não terem trabalhado com
carteira assinada. Com a mudança, passariam a contribuir para receber uma aposentadoria
digna no futuro.
Dedução do IR
Também incluída no texto pela Câmara, a dedução das despesas
com a contribuição previdenciária relativa ao empregado doméstico no Imposto de
Renda do empregador foi mantida pelo Senado. Para Ana Amélia (PP-RS) o texto
precisa compensar os empregadores para evitar o aumento da informalidade e do
desemprego.
? Não se pode onerar demasiadamente os encargos sociais e
previdenciários a cargo do patrão, sob pena de o labor doméstico se tornar
inviável ? argumentou.
Todas as contribuições relativas ao empregado doméstico
serão pagas em um único boleto bancário, por meio do regime unificado de
pagamento de tributos, contribuições e demais encargos do empregador doméstico
(Simples Doméstico). O documento poderá ser retirado pela internet. O
Ministério do Trabalho publicará portaria sistematizando o pagamento.
Jornada
O Senado também rejeitou mudança da Câmara relativa à
compensação de horas. O texto aprovado pelo Senado em 2013 previa que as horas
deveriam ser compensadas em um ano, proposta defendida por Romero Jucá. Na
Câmara, o limite foi reduzido para três meses, mudança defendida por Ana
Amélia.
De acordo com o texto aprovado nesta quarta-feira, o
trabalho que exceder a 44 horas semanais será compensado com horas extras ou
folgas, mas as 40 primeiras horas extras terão que ser remuneradas. As horas
extras excedentes deverão ser compensadas no prazo máximo de um ano.
Os senadores acataram mudança feita pela Câmara para
permitir a cobrança do imposto sindical de empregados e empregadores. O texto
inicial do Senado previa a isenção dessa contribuição. Segundo Jucá, na
prática, isso não se aplicará aos empregadores domésticos porque eles não são
uma categoria econômica.
Durante a aprovação, vários senadores homenagearam a
deputada Benedita da Silva (PT-RJ), ex-empregada doméstica e relatora do texto
na Câmara. Benedita, que compareceu ao Senado para acompanhar a votação, foi
citada por Gleisi Hoffmann (PT-PR), Jorge Viana (PT-AC), Fátima Bezerra
(PT-RN), Vanessa Grazziotin, Lúcia Vânia, Randolfe Rodrigues e Lindbergh
Farias, entre outros.
Veja, abaixo, os
principais pontos aprovados:
Definição e contrato
O emprego doméstico é caracterizado quando um empregado
trabalha acima de dois dias na semana em uma mesma residência. Empregador e
empregado firmarão contrato de trabalho que poderá ser rescindido a qualquer
tempo, por ambas as partes, desde que pago o aviso-prévio na forma que prevê a
CLT. O contrato de experiência poderá ter prazo inferior a 45 dias.
É proibida a contratação de menor de 18 anos para fins de trabalho
doméstico.
Jornada de trabalho
A jornada de trabalho é de oito horas diárias e 44 horas
semanais, mas o empregador poderá optar pelo regime de 12 horas de trabalho
seguidas por 36 de descanso. O intervalo para almoço vai de uma a duas horas,
mas poderá ser reduzido para 30 minutos por acordo escrito entre empregador e
empregado.
Banco de horas
O trabalho que exceder a 44 horas semanais será compensado
com horas extras ou folgas, mas as 40 primeiras horas extras terão que ser
remuneradas. As horas extras deverão ser compensadas no prazo máximo de um ano.
FGTS e INSS
Ao todo, o empregador pagará mensalmente 20 de alíquota
incidente no salário pago (8 FGTS + 8 INSS + 0,8 seguro contra acidente +
3,2 relativos à rescisão contratual).
Multa em caso de demissão
A multa de 40 nas demissões será custeada por alíquota
mensal de 3,2 do salário, recolhida pelo empregador em um fundo separado ao do
FGTS. Essa multa poderá ser sacada quando o empregado for demitido, mas nas
demissões por justa causa, licença, morte ou aposentadoria, o valor será
revertido para o empregador.
Super Simples Doméstico
Será criado no prazo de 120 dias após a sanção da lei. Por
meio do Super Simples, todas as contribuições serão pagas em um único boleto
bancário, a ser retirado pela internet. O Ministério do Trabalho publicará
portaria sistematizando seu pagamento.
Viagem
As horas excedidas pelo empregado durante viagens com a
família do empregador poderão ser compensadas após o término da viagem. A
remuneração será acrescida em 25 , e o empregador não poderá descontar dela
despesas com alimentação, transporte e hospedagem.
Férias e benefícios
Os 30 dias de férias poderão ser divididos em dois períodos
ao longo de um ano, sendo que um dos períodos deverá ser de no mínimo 14 dias.
O seguro desemprego poderá ser pago durante no máximo três
meses. O texto da Câmara previa o pagamento por cinco meses, assim como ocorre
com os demais trabalhadores.
A licença-maternidade será de 120 dias.
O auxílio transporte poderá ser pago por meio de ?vale? ou
em espécie.
O aviso-prévio será pago proporcionalmente ao tempo
trabalhado.
O trabalhador terá direito ao salário-família, valor pago
para cada filho até a idade de 14 anos e para os inválidos de qualquer idade.
Segundo a legislação do salário família, o empregador deve pagar diretamente ao
empregado e descontar de sua parte da contribuição social todo mês.
Acerto com a Previdência
Será criado o Programa de Recuperação Previdenciária dos
Empregados Domésticos (REDOM), pelo qual poderá haver o parcelamento dos
débitos com o INSS vencidos em 30/04/2013. O parcelamento terá redução de 100
das multas e dos encargos advocatícios; e de 60 dos juros.
Os débitos incluídos no Redom poderão ser parcelados em até
120 dias, com prestação mínima de R$ 100; e o parcelamento deverá ser requerido
pelo empregador no prazo máximo de 120 dias contados a partir da sanção da lei.
O não pagamento de três parcelas implicará em rescisão imediata do
parcelamento.
Fiscalização
As visitas do Auditor-Fiscal do Trabalho serão previamente
agendadas, mediante entendimento entre a fiscalização e o empregador. Foi
retirada do texto a previsão de visita sem agendamento com autorização judicial
em caso de suspeita de trabalho escravo, tortura, maus tratos e tratamento
degradante, trabalho infantil ou outra violação dos direitos fundamentais.
Agência Senado