MP da Liberdade Econômica alterou código civil e fundos de investimento

Além de mudanças em regras trabalhistas – como a manutenção
da restrição de trabalho aos domingos – e medidas de desburocratização,
Medida
Provisória 881/2019
, conhecida como MP da Liberdade Econômica promoveu
várias outras alterações, entre elas, mudanças no Código Civil e em regras dos
fundos de investimento. O texto foi aprovado nesta quarta-feira (21) pelo
Senado e ainda precisa passar pela sanção presidencial.

O texto aprovado considera abuso do poder regulatório ações
do governo como favorecer grupo econômico ou profissional na regulação, criando
reserva de mercado; redigir enunciados que impeçam a entrada de novos
competidores no mercado; e exigir especificação técnica que não seja necessária
para atingir o fim desejado; entre outras.

A MP também enumera direitos do empreendedor, seja empresa
ou pessoa física. Entre eles está o de definir livremente os preços. Essa
liberdade se restringe a mercados não regulados e tem exceções como situações
em que o preço de produtos e de serviços seja usado para reduzir o valor de
tributo. Também não valerá para confrontar a legislação da defesa da
concorrência, os direitos do consumidor e as situações previstas em lei
federal.

Outro direito previsto na MP é desenvolver, executar, operar
ou comercializar novas modalidades de produtos e de serviços quando as normas
infralegais se tornarem desatualizadas por força de desenvolvimento tecnológico
consolidado internacionalmente. O texto traz, ainda, a garantia de que não será
exigida pela administração pública direta ou indireta, nenhuma certidão sem
previsão expressa em lei.

Para o senador Carlos Viana (PSD-MG), o Brasil precisa dizer
àqueles que querem gerar trabalho, que eles são bem-vindos para que o país
possa reencontrar o caminho do crescimento.

– É hora do nosso país começar a encarar com coragem os
novos tempos, para que a gente possa gerar empregos para os 13 milhões de
brasileiros que estão nas filas todos os meses à espera de trabalho. Esse é o
nosso dever aqui, é o que o povo espera de nós senadores – afirmou o senador.

Proteção

O texto aprovado altera o Código Civil para
estabelecer que a pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios,
associados, instituidores ou administradores. Além disso, prevê que a autonomia
patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação
de riscos. Essas garantias foram incluídas pelo Congresso. O texto original da
MP já trazia mudanças nas regras de desconsideração da personalidade jurídica,
previstas em lei.

Por essa regra, os bens particulares dos administradores e
sócios podem ser atingidos por decisões judiciais contra a empresa, em caso de
abuso da personalidade jurídica. Isso ocorre quando há desvio (a empresa foi
usada para lesar credores ou praticar atos ilícitos) ou quando há confusão
patrimonial (ausência de separação de fato do patrimônio da empresa do dos
sócios). Pelo texto da MP, nem todos os sócios terão o risco de perder bens,
apenas aqueles que tiverem sido beneficiados direta ou indiretamente pelo
abuso.

Empresas do mesmo grupo empresarial também não podem ter
seus recursos usados no caso desconsideração da personalidade jurídica da
associada, a não ser no caso de desvios e confusão patrimonial.

O texto protege ainda o patrimônio do titular das empresas
individuais de responsabilidade limitada (Eireli) na liquidação de dívidas da
empresa em qualquer situação, exceto fraude.

Além disso, permite a existência de sociedade limitada com
apenas um sócio. Diferentemente da Eireli, sociedade limitada unipessoal, não
exige a integralização de um capital social de pelo menos 100 salários mínimos,
valor impeditivo para a maior parte dos microempresários do país. De
acordo com o Executivo, na prática, muitas vezes essas empresas têm sócios
chamados apenas para preencher a necessidade de pluralidade. O texto corrige
esse problema.

Negócio jurídico

A MP também prevê que, nos contratos privados, devem
prevalecer o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisa?o
contratual. Os contratos civis e empresariais são considerados paritários e
simétricos até que surjam elementos para afastar essa presunção. Para a
senadora Zenaide Maia (Pros-RN), essa alteração, incluída no Congresso,
prejudica pequenos empresários.

– A mudança acaba com a proteção das empresas pequenas,
hipossuficientes, ou seja, parte do princípio de que uma pequena empresa vai
fechar um negócio com uma grande multinacional, e terá a proteção que o Código
Civil dá – disse a senadora.

Ainda de acordo com o texto, é permitido às partes pactuar
livremente regras de interpretação, preenchimento de lacunas e integração dos
negócios jurídicos diversas daquelas previstas em lei.

Hoje, o código prevê que os negócios jurídicos devem ser
interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. Já o
texto aprovado determina outros requisitos, como o comportamento das partes
posterior à celebração do negócio e os usos, costumes e práticas do mercado
relativas ao tipo de negócio.

Fundos de investimento

A MP permite aos fundos de investimento limitar a
responsabilidade de cada investidor ao valor aplicado e, também, a
responsabilidade de seus administradores, sem solidariedade entre cada um dos
prestadores de serviços fiduciários (administradores da carteira). No
Congresso, foi incluída a permissão para a criação de classes diferenciadas de
cotas, com direitos e obrigações distintas e patrimônio separado das demais. A
medida, segundo especialistas, protege investidores de terem que assumir para
si passivos do fundo.

Outra alteração incluída pelos parlamentares isenta os
administradores, responsáveis pela escolha de risco e gerenciamento das
aplicações, de responder pelas obrigações do fundo, exceto no caso de dolo ou
má-fé. Pelas novas regras, se o fundo não possuir patrimônio suficiente para
quitar as cotas em resgate, os cotistas entrarão na lista de credores segundo
as regras de insolvência.

Ainda de acordo com o texto aprovado, o registro dos
regulamentos na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) é suficiente para seus
efeitos, sem necessidade de divulgação ao aplicador.

Comitê

Para uniformizar procedimentos na área tributária, a Medida
Provisória 881/19 prevê a criação de um comitê formado por integrantes do
Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, da Receita Federal e da
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para editar súmulas da
administração tributária federal a serem seguidas por todos os órgãos.

O texto proíbe os auditores fiscais da Receita de
constituírem créditos tributários para a União contrariando pareceres da PGFN,
da Advocacia-Geral da União (AGU) ou sobre temas-objeto de súmula da
administração tributária federal, assim como temas decididos pelos tribunais
superiores.

Dívidas cujo valor é economicamente desvantajoso para a PGFN
cobrar em dívida ativa passarão a ter seu teto estabelecido em ato do
procurador-geral. Atualmente, a lei estipula esse teto em R$ 10 mil (valor
igual ou abaixo disso não é cobrado).

Outros temas

O texto ainda formaliza a extinção do Fundo Soberano do
Brasil (FSB), criado em 2008 como uma espécie de poupança para tempos de crise
e cujo saldo já estava zerado desde a MP
830/2018
. A MP acabou rejeitada, mas o dinheiro já havia sido realocado
para o pagamento da dívida pública.

Com isso, o fundo não deixou de existir formalmente, mas
ficou sem recursos. A manutenção do fundo, de acordo com o Executivo, cria
demandas administrativas e burocráticas que consomem tempo e recursos públicos
desnecessariamente.

O texto aprovado nesta quarta-feira também revogou a da Lei
Delegada 4, de 1962, que permite ao Estado intervir na economia para garantir a
venda de bens ao consumidor (em situações de desabastecimento, por exemplo).

Outro dispositivo revogado que exigia o uso do princípio da
reciprocidade para a instalação de empresas estrangeiras de seguro no país,
inclusive quanto a vedações e restrições. (Agência Senado).

Foto: Roque de Sá/Agência Senado

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