O Senado aprovou em segundo turno nesta sexta-feira (17) a
Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/2020, que simplifica os gastos do governo
federal para o combate à pandemia de coronavírus. Conhecida como PEC do
Orçamento de Guerra, a matéria permite processos mais rápidos para compras,
obras e contratações de pessoal temporário e serviços. O texto foi aprovado em
sessão remota do Plenário e volta à Câmara, que deve analisar as mudanças
sugeridas pelos senadores.
O relator, senador Antonio Anastasia (PSD-MG), acatou 27 das
61 emendas apresentadas pelos senadores no primeiro turno. Ele aumentou os
mecanismos de prestação de contas pelo Poder Executivo; incluiu dispositivos
para preservar empregos; e restringiu as hipóteses em que o Banco Central pode
comprar títulos privados (veja mais detalhes abaixo). As alterações
foram mantidas no segundo turno. Foram 63 votos a favor e 15 contra o
substitutivo de Anastasia. Houve uma abstenção.
A PEC foi apresentada no dia 1º de abril pelo presidente da Câmara,
deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). A matéria institui um regime extraordinário
fiscal, financeiro e de contratações para o enfrentamento da calamidade
pública. A União pode adotar esse modelo de gastos durante a pandemia, mas
apenas em casos de urgência: quando a necessidade ?for incompatível com o
regime regular? de despesas.
Alguns parlamentares chegaram a defender o adiamento da
votação. O senador Telmário Mota (Pros-RR) criticou a hipótese de uma
proposta que altera a Constituição ser apreciada durante uma sessão virtual.
Ele questionou ainda o fato de a PEC 10/2020 prever a possibilidade de o Banco
Central comprar títulos e ativos de empresas com risco de liquidez.
– É uma barbaridade. É incrível como, em um estado desses,
vão mexer na Constituição. Estou inconformado de ver o Senado mexer na
Constituição para beneficiar os banqueiros, para encher mais ainda os bolsos de
quem sempre ganhou dinheiro das mãos calejadas do trabalhador brasileiro.
O senador Otto Alencar (PSD-BA) defendeu a aprovacão do texto.
– Quero reiterar e elogiar a dedicação e o trabalho do nobre
senador Antonio Anastasia, que fez um trabalho brilhante e melhorou muito a
matéria e a letra de lei que veio da Câmara. Espero que os deputados possam
também acolher essas modificações, que foram corretas, sintonizadas com aquilo
que pensa o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que merece a
nossa confiança.
Veja os principais pontos da PEC 10/2020:
“Regra de ouro” – A União fica autorizada descumprir
a chamada “regra de ouro” do Orçamento durante todo o ano em que vigorar o
estado de calamidade. Isso significa que o governo pode se endividar para pagar
despesas correntes, como salários, aposentadorias e custeio da máquina pública.
Antes da pandemia, isso seria considerado crime de responsabilidade. O
Ministério da Economia deve publicar a cada 30 dias um relatório com valores e
custo das operações de crédito realizadas.
Contratação de pessoal – A PEC permite a contratação
temporária de pessoal, mesmo que não haja dotação prévia ou autorização
específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), exceção que vale apenas
durante a pandemia de coronavírus.
Criação de despesas – Proposições legislativas e atos do
Poder Executivo podem prever o aumento de despesas ou a ampliação de incentivos
tributários para criar, expandir ou aperfeiçoar ações governamentais de combate
aos efeitos sociais e econômicos do coronavírus. Mas essas despesas não podem
ser permanentes: valem apenas durante o estado de calamidade.
Benefícios tributários – O processo simplificado deve
assegurar, quando possível, a competição e a igualdade de condições entre os
concorrentes. Empresas contratadas pela União para atuar em programas de
combate ao coronavírus podem receber benefícios creditícios, financeiros e tributários.
Mas ficam obrigadas a manter o emprego dos seus trabalhadores. Empresas em
débito com o sistema da seguridade social ficam autorizadas a firmar contratos
com o poder público e até mesmo a receber benefícios fiscais, outra exceção que
vale apenas durante o estado de calamidade.
Prestação de contas – As autorizações de despesas
para o combate ao coronavírus devem constar em programações orçamentárias
específicas e ser incluídas nos relatórios de execução orçamentária do Poder
Executivo. Mas esses gastos devem ser avaliados separadamente na prestação de
contas do presidente da República.
Títulos e ativos 1 – O Banco Central fica autorizado
a comprar e vender títulos do Tesouro Nacional e ativos privados. Mas só nos
chamados mercados secundários: isso significa que a autoridade monetária não
pode adquirir títulos diretamente do Tesouro ou das empresas, mas apenas de
quem já detenha os papéis (como bancos e fundos de investimentos). A
preferência é para a aquisição de títulos emitidos por micro, pequenas e médias
empresas. O objetivo é garantir a liquidez dessas companhias.
Títulos e ativos 2 – No caso dos ativos, eles
precisam ter baixo risco (classificados na categoria “BB” ou superior). A
regra vale para debêntures não conversíveis em ações; cédulas de crédito
imobiliário; certificados de recebíveis imobiliários; certificados de
recebíveis do agronegócio; notas comerciais; e cédulas de crédito bancário. A
venda dos ativos adquiridos pelo Banco Central pode ocorrer após a vigência do
estado de calamidade.
Contrapartidas – Ao comprar ativos de instituições
financeiras, o Banco Central pode exigir contrapartidas. Os bancos que venderem
os títulos ficam proibidos, por exemplo, de aumentar a remuneração de diretores
e membros do conselho de administração, inclusive bônus, participação nos
lucros e incentivos remuneratórios associados ao desempenho. Outro impedimento
é pagar dividendos acima do mínimo obrigatório estabelecido em lei.
Transparência – O presidente do Banco Central deve
prestar contas ao Congresso Nacional, a cada 30 dias, sobre as operações de
compra de títulos e ativos. A instituição deve ainda publicar diariamente as
operações realizadas, com informações sobre taxas de juros pactuadas, valores
envolvidos e prazos.
Dívida mobiliária – Durante a pandemia, a União pode
pagar juros e encargos da dívida mobiliária com empréstimos feitos apenas para
refinanciá-la. Essa dívida é formada pelos títulos emitidos pelo Tesouro e pelo
Banco Central e em poder do mercado.
Insumos de saúde – A União deve adotar critérios
objetivos para distribuir, entre estados e municípios, os equipamentos e
insumos de saúde imprescindíveis ao enfrentamento do coronavírus.
Irregularidades – Atos do Poder Executivo que
configurem irregularidade ou descumprimento dos limites previstos podem ser
sustados pelo Congresso Nacional por meio de decreto legislativo.
Validade – A PEC convalida atos de gestão praticados
pelo Poder Executivo desde o dia 20 de março de 2020. Se promulgada, a Emenda
Constitucional deve ser revogada automaticamente no encerramento do estado de
calamidade provocado pelo coronavírus. (Agência Senado).
Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado