Adeus Reforma Política

De repente, salta aos olhos que
não haverá reforma política, por mais que o presidente da Câmara, Eduardo
Cunha, anuncie uma semana de esforço concentrado para votação das diversas
propostas. A razão é simples: partidos, grupos partidários e até parlamentares
isolados discordam mais do que concordam com as mudanças debatidas. Se estão a
favor de determinado projeto, com mais intensidade ficam contra outros, mesmo
trocando de posição a cada análise. Vale o interesse pessoal em cada discussão,
pois todos analisam apenas os benefícios e os malefícios projetados para as
próximas eleições.

O sonho acabou. Apesar de no
Senado uma ou outra reforma haver sido aprovada, é na Câmara que residem as
resistências. O que favorece a minoria prejudica a maioria, em cada caso
especifico.Vale alinhar o que não será aprovado, precisamente o cerne da
reforma política.

O chamado distritão aprimoraria
de muito a representação popular nas eleições proporcionais para deputado.
Evitaria a eleição de um candidato com menos votos do que outro, como acontece
há muito. Seria exigido o fim das coligações partidárias, responsável pela
aberração de o mais votado perder a vaga para os menos votados. Os pequenos
partidos são contra, perderiam em número de deputados, mas entre os grandes,
muita gente também protesta, temendo ficar de fora na próxima Legislatura.
Resultado: adeus distritão.

A proibição das doações de
empresas conquistou a opinião pública, em especial depois dos escândalos na
Petrobrás. Ficariam proibidas as colaborações das empreiteiras e sucedâneos,
defensoras do [é dando que se recebe], ou seja, prontas para cobrar na
legislação os juros dados na eleição. O máximo que se admite é a limitação das
doações de pessoas jurídicas, que nada resolverá: primeiro porque o dinheiro
continuará a fluir por baixo do pano; depois porque um empresário com 50 mil
empregados, por exemplo, exigirá de cada um que vista a fantasia de doador,
mesmo saindo os recursos dos cofres da empresa. Quantos deputados não seriam
deputados caso desprovidos das contribuições do capital?

Como consequência, morre a tese
do financiamento público das campanhas, aliás despropositada num país onde
faltam meios para a educação e a saúde pública.

Também parece condenada a
proposta da votação em listas partidárias fechadas e não pessoalmente em
candidatos. Trata-se de desejo do PT, mas fica evidente que a confecção das
listas caberá aos caciques partidários, que se colocarão na cabeça das relações.

Vai para o buraco outra reforma
retoricamente defendida pela maioria, a extinção do princípio da reeleição para
presidente, governador e prefeito. Na hora da decisão, todos pensarão poder um
dia, no futuro, beneficiar-se dessa contradição fajuta, que faz o candidato à
reeleição permanecer no exercício do mandato, coma caneta e o diário oficial na
mão. Os detentores do poder não querem nem ouvir falar da
desincompatibilização, calcados na fraude imposta anos atrás pelo então
presidente Fernando Henrique Cardoso e seguida pelo Lula e Dilma. A reeleição é
como a calvice: uma vez caracterizada, não sai mais, inexistindo peruca que dê
jeito.

Falou-se muito na cláusula de
barreira ou de desempenho, que acabaria com a farra de mais de 40 partidos
autorizados a funcionar, os de verdade e os de aluguel. A pressão dos pequenos,
porém, soma-se ao temor dos grandes de diminuir. Consequência: tudo fica como
está.

Se dependesse apenas da Câmara,
seriam extintos os suplentes de senador, aquele que geralmente não tem votos
mas dispõem de muito dinheiro para financiar os titulares. O diabo é que os
senadores, se contrariados com a supressão, poderiam dar o troco aos deputados,
levantando matérias capazes de criar constrangimentos aos colegas. Sendo assim,
os suplentes deverão continuar.

Surgiu nos últimos dias o projeto
de extinção do foro especial para julgamento de deputados e senadores, que
passariam a responder por seus crimes nos juízos de primeira instância. Apesar
de os processos se estenderem por muito mais tempo, já que existem a segunda, a
terceira e até a quarta instância, a maioria parlamentar prefere ficar com a
facilidade de ser julgada pelos doutos ministros da mais alta corte nacional de
justiça, livres de bissextas investidas de companheiros do juiz Sérgio Moro.

Outra mudança considerada
fascinante atingiria a forma de seleção dos ministros do Supremo Tribunal
Federal. Não deixa de ser perigosa a fórmula de o presidente da República
indicar e o Senado aprovar cada designação. Um partido que permaneça dezesseis
anos no poder, como pretende o PT, acabará por ter indicado todos os onze
ministros, que mesmo impolutos e de reputação ilibada, não deixarão de
sensibilizar-se por seus padrinhos. Mas vai ficar tudo como está, pela falta de
mecanismos alternativos.

Em suma, existem outras propostas
de reforma política não referidas aqui e que também não serão aprovadas. Ficam
para outro dia. (Carlos Chagas)

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