A ex-gerente da Petrobras Venina Velosa da Fonseca
esteve pessoalmente com Graça Foster informando-a sobre irregularidades em
contratos de diversos setores da companhia, na época em que a atual presidente
da empresa era diretora de Gás e Energia. Ela contou ao Fantástico contou que |percebeu
que havia irregularidades| em 2008 e que, desde então, reportou problemas aos
superiores, entre eles o gerente-executivo, diretores e a atual presidente.
A documentação com as denúncias da gerente foi entregue
ao Ministério Público, que investiga o escândalo de corrupção na Petrobras no
âmbito da Operação Lava Jato. Ela disse que |vai até o fim| nas denúncias, e
informou que outros funcionários da empresa sabem das irregularidades, por isso
fez um apelo para que todos eles sigam seu exemplo e também denunciem o que
sabem sobre o esquema de corrupção na estatal.
Venina disse que havia todos os tipos de
irregularidades, como pagamentos por serviços não-prestados, contratos
aparentemente superfaturados, negociações em que eram solicitadas comissões
para as pessoas envolvidas e uma série de problemas que feriam o código de
ética e os procedimentos da empresa. Segundo Venina, havia o |esquartejamento|
de projetos para dificultar a fiscalização.
A ex-gerente assegurou que Graça Foster foi informada
das irregularidades não só por email, mas, também, pessoalmente.
|Num primeiro momento, em 2008, como gerente-executiva,
eu informei ao então diretor Paulo Roberto Costa, informei a outros diretores
como a Graça Foster, e em outro momento, como gerente-geral, eu informei aos
meus gerentes-executivos, José Raimundo Brandão Pereira e o Abílio [Paulo
Pinheiro Ramos], que era meu atual gerente-executivo. Informei ao diretor [José
Carlos] Cosenza (?) Informei ao presidente [José Sérgio] Gabrielli. Informei a
todas a pessoas que eu achava que poderiam fazer alguma coisa para combater
aquele processo que estava se instalando dentro da empresa|, afirmou.
Na época, Graça Foster era diretora de Gás e Energia.
Ela assumiu o atual cargo em fevereiro de 2012, substitutindo Sérgio Gabrielli,
que estava no cargo desde julho de 2005.
|Eu estive com a presidente [Graça Foster] pessoalmente
quando ela era diretora da área de Gás e Energia. Naquele momento, nós
discutimos o assunto. Foi passado uma documentação pra ela sobre o processo de
uma denúncia na área de comunicação. Depois disso, a gente (?) ela teve acesso
a essas irregularidades nas reuniões da diretoria-executiva|, declarou Venina
Velosa. |Em nenhum momento, se não houve a compreensão daquilo do que eu estava
falando, fui chamada a dar esclarecimento a respeito do assunto|, acrescentou.
Ela mostrou o conteúdo de um e-mail enviado a Graça
Foster em outubro de 2011, na qual diz que gostaria conversar |olhando direto
nos seus olhos|.
Encontro
com Paulo Roberto Costa
Venina lembrou que, ao relatar o problema ao atual
delator do esquema, Paulo Roberto Costa, foi acusada de ?querer derrubar o
governo?.
|Esse evento aconteceu quando eu fui apresentar o
problema que ocorreu na área de comunicação, que eu cheguei na sala dele e
falei, |olha aqui tem só uma amostra do que tá acontecendo nessa área|. Eram
vários contratos de pequenos serviços onde nós não tínhamos conhecimento do
tipo de serviço, se aquilo estava sendo realmente prestado. Mas mostrava um
esquartejamento do contrato. Aí naquele momento, eu falei: |eu nunca soube nada
disso, eu estou sabendo disso agora e eu acho que isso é muito sério e acho que
devemos que tomar atitude em relação a isso|. Aí ele pediu que eu procurasse o
gerente responsável e pedisse pra que ele parasse|, relembra ela.
|Ai eu falei com ele o seguinte: |ele já fez, não tem
como eu agora chegar e falar |vamos esquecer o que aconteceu e vamos realmente
trabalhar diferente daqui pra frente?| Existia um fato concreto que tinha que
ser apurado e que tinha que ser investigado. Aí nesse momento ele ficou muito
irritado comigo. A gente tava sentado numa mesa da sala dele, ele apontou pro
retrato do Lula, apontou também pra direção da sala do Gabrielli e me
perguntou: |você quer derrubar todo mundo?| Aí eu fiquei assustada e falei pra
ele assim: |olha, eu tenho duas filhas, eu tenho que colocar a minha cabeça num
travesseiro e dormir, e no outro dia de manhã eu tenho que olhar nos olhos dela
e não sentir vergonha|.
Paulo Roberto Costa, que chefiou a diretoria de Abastecimento
de 2004 a 2012, assinou um acordo de delação premiada para contar o que sabe em
troca de uma possível redução de pena. Atualmente, cumpre prisão domiciliar.
Ela negou ter participado de qualquer esquema com Paulo
Roberto Costa. |Se eu tivesse participado de algum esquema, eu não estaria aqui
hoje. Eu não teria feito a denúncia que eu fiz, não teria ido ao Ministério
Público, entregue o meu computador com todos os documentos que eu tenho desde
2002|, disse.
Contratos
do ex-marido
Venina rebateu uma denúncia de que teria beneficiado o
ex-marido com um contrato feito na empresa. Ela relata que os contratos do
ex-marido com a estatal eram de 2004 e de 2006 e que a condição que apresentou
para assumir o relacionamento, em 2007, foi que o contrato fosse descontinuado.
|O contrato foi anterior ao casamento e, no momento em
que a gente assumiu essa relação, a condição foi: vamos interromper esse
contrato porque tem uma questão de ética dentro da Petrobras e minha que eu não
posso aceitar. E isso foi feito com parecer jurídico|, afirma.
|Agora, eu só quero deixar bem claro que essa empresa é
uma empresa muito competente. Não fui só eu que fiz o contrato, a atual
presidente quando trabalhava na [diretoria de] TVG, lá em 2001, 2002, também
assinou um contrato com ele. E depois, talvez em 2008, também assinou um
contrato com essa mesma empresa para fazer integração dos modelos de gestão das
termoelétricas. Então o que eu posso falar é que ela fez isso com base nas
características técnicas da empresa da mesma forma que eu fiz antes de me
casar. E depois de casada nós interrompemos o contrato|, acrescentou.
Convocação a demais funcionários
Venina lembra que, durante todo o processo da comunicação
das irregularidades, foi |assediada| e |pressionada| por assistentes da
diretoria e da presidência que falavam: |tem muita gente envolvida, você não
pode tratar essa questão dessa forma?. Em seguida, diz que recebeu |várias|
ameaças por telefone.
|A única coisa que me sobrou foi meu nome. E quando eu
vi que eles colocaram meu nome associado a coisas que eu não fazia, eu chamei
minhas duas filhas e falei: |olha meninas, ou eu reajo e tento fazer, limpar
meu nome, ou vou deixar isso acontecer, a gente vai ter uma certa tranquilidade
agora e o trator vai passar por cima depois|, disse.
Venina admitiu ter medo das consequências das suas
denúncias, mas disse que irá |até o fim|. E convocou os funcionários da
Petrobras a terem a mesma atitude.
|Eu tenho medo? Tenho medo. Mas eu não vou parar. Eu
espero que os empregados da Petrobras, porque eu tenho certeza que não foi só
eu que presenciei, eu espero que os empregados da Petrobras criem coragem e
comecem a reagir. Nós temos que fazer isso para poder realmente fazer a nossa
empresa de volta a ser o que era. A gente tem que sentir orgulho, os
brasileiros têm que sentir orgulho dessa empresa. Eu vou até o fim. Eu tô convidando
vocês pra virem também|, completou.
Petrobras
diz que tomou todas as providências
A Petrobras voltou a declarar que tomou todas as
providências para elucidar os fatos citados por Venina Velosa da Fonseca.
Segundo a empresa, não procede a afirmação de que não houve apuração sobre as
irregularidades apontadas por Venina porque todas foram encaminhadas às
autoridades competentes.
A Petrobras também repetiu que, possivelmente, a
funcionária trouxe a público as denúncias porque foi responsabilizada por uma
comissão interna. A empresa reafirmou que Graça Foster e José Carlos Cosenza
não sabiam de irregularidades e que a presidente da Petrobras só foi informada
dessas irregularidades, por Venina da Fonsenca, no dia 20 do mês passado.
O ex-presidente da Petrobras, Sergio Gabrielli, afirmou
que nunca foi informado diretamente por Venina da Fonseca sobre a existência de
corrupção na empresa.
A defesa de Paulo Roberto Costa declarou que
praticamente todos os aspectos investigados pelo Ministério Público Federal
foram mencionados na delação premiada do ex-diretor e que não há como comentar
incidentes específicos.
Venina
Velosa
O ex-presidente Lula não quis se pronunciar. E os demais
citados na reportagem não foram encontrados.
E em entrevista publicada neste domingo por jornais da
América Latina, a presidente Dilma Rousseff afirmou que o Brasil não vive crise
de corrupção.
Entenda
as denúncias de Venina
Há nove dias, uma reportagem do jornal |Valor Econômico|
mostrou que a ex-gerente alertou diversas vezes sobre a ocorrência de
irregularidades em contratos da Petrobras antes mesmo de a Polícia Federal (PF)
deflagrar em março a Operação Lava Jato. Antiga subordinada do ex-diretor da
Petrobras Paulo Roberto Costa, ela foi transferida para a Ásia após denunciar o
esquema de corrupção e, posteriormente, foi afastada.
O jornal relatou que, apesar das advertências, a direção
da empresa não agiu para conter os desvios bilionários e ainda destituiu de
seus cargos os executivos que tentaram barrar o esquema de corrupção.
A Petrobras afirmou, na terça-feira (16), que a
ex-gerente só enviou em novembro deste ano, à presidente da estatal, Maria das
Graças Foster, e-mail alertando sobre irregularidades na refinaria de Abreu e
Lima, em Pernambuco, e nas áreas de Comunicação do Abastecimento e à área de
comercialização de combustível de navio (bunker).
?Os temas supracitados foram apenas levados ao
conhecimento da Presidente através de email recente, de 20/11/2014, quando a
empregada já havia sido destituída de sua função gerencial. Nesta data, as
irregularidades na Comunicação do Abastecimento e na RNEST já haviam sido
objeto de averiguação em Comissões Internas de Apuração, bem como as
irregularidades da área de comercialização de combustível de navio (bunker) em
Grupos de Trabalho?, diz a Petrobras em nota.
Ainda segundo a estatal, Graça Foster respondeu a Venina
no dia seguinte, |informando que estava encaminhando o assunto ao Diretor José
Carlos Cosenza e ao Jurídico da Petrobras para averiguação e adoção das medidas
cabíveis|. (Diario do Poder).