A Polícia Federal pediu
perdão judicial para o engenheiro Everton Reinheimer, delator do cartel dos
trens. No mesmo pedido à Justiça Federal em São Paulo, a PF pleiteia o
benefício para outro delator, Jean Malte Orthman. A PF argumenta que os dois
ex-executivos da multinacional alemã Siemens tiveram papel decisivo na investigação
que desmontou o conluio de gigantes do setor para conquistar contratos
bilionários do Metrô e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), no
período entre 1998 e 2008 ? governos Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin,
todos do PSDB.
Reinheimer é identificado
pela PF como |colaborador X| e Orthman, como |colaborador Y|. Eles fizeram
delação em outubro de 2013. Abordaram amplamente detalhes de como atuava o
cartel e revelaram métodos dessas sociedades que se ajustaram para fraudar
licitações, segundo a PF. Reinheimer foi além: ele indicou nomes de políticos,
entre os quais deputados federais, que teriam sido beneficiários de propinas
das empresas. Os políticos negam.
A PF não indiciou
Reinheimer nem Orthman no inquérito do cartel. Ao contrário, representou pela
decretação do perdão judicial para os dois ex-executivos da Siemens que, em
2013, fechou um acordo de leniência com o Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade), órgão antitruste do governo federal.
Na representação pelo perdão
aos delatores, o delegado Milton Fornazari Jr. assinala que ambos se
apresentaram concomitantemente a ele e à Procuradoria da República. |Sempre
colaboraram nos autos espontaneamente, trazendo elementos aptos a elucidar os
fatos criminosos dos quais tiveram conhecimento e participação|, destaca o
delegado da PF que investigou o cartel.
Na avaliação de Fornazari,
os delatores foram decisivos para três resultados da investigação: 1)
identificação dos demais coautores e partícipes das infrações penais por eles
praticadas; 2) revelação da estrutura hierárquica e da divisão das tarefas nas
empresas corruptoras; 3) recuperação parcial do produto ou do proveito das
infrações penais praticadas.
Cargos de confiança
A PF amparou o pedido de
perdão no artigo 4.º, parágrafo 2.º da Lei 12.850/2013. Essa norma confere ao
delegado de polícia, nos autos do inquérito e com manifestação do Ministério
Público, poderes para requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão
judicial ao colaborador.
Reinheimer, ex-diretor da
Divisão de Transportes da Siemens, é personagem-chave do escândalo do cartel.
Em outubro de 2013, ele fez delação à PF, em troca de redução de pena em caso
de uma eventual condenação ? a Justiça decidirá se acolhe o pleito da PF no fim
do processo do cartel.
O relato de Reinheimer
preocupou o governo paulista porque citou deputados que, na época, ocupavam
cargos de confiança no Palácio dos Bandeirantes, no comando de secretarias
estratégicas. Ele não apresentou provas, mas suas declarações provocaram a
remessa do inquérito da PF para o Supremo Tribunal Federal (STF), que detém
competência exclusiva para investigar e processar parlamentares com foro
privilegiado perante a Corte.
Em fevereiro de 2014, o
ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso no STF, dividiu a investigação.
Manteve sob guarda do Supremo a parte relativa aos políticos e mandou de volta
para a primeira instância da Justiça Federal a parte sobre empresários,
executivos das multinacionais, doleiros e lobistas.
No dia 28 de novembro, Fornazari
Jr, da Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros (Delefin) da PF em São
Paulo, indiciou criminalmente 33 investigados, entre eles o presidente da CPTM,
Mário Bandeira, e o diretor de Operações da estatal, José Luiz Lavorente, que
negam ilícitos.
O relatório da PF sobre o
cartel preenche 127 páginas e pede à Justiça que compartilhe as informações e
provas com o STF, com o procurador-geral de São Paulo, Márcio Elias Rosa, e com
o Banco Central ? aqui, para instrução de processo administrativo em razão de
indícios da manutenção ilegal de depósitos no exterior por dez dos
investigados. (Fausto Macedo/O Estado de S.Paulo)
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