A Comissão Especial para Avaliação dos Impactos da Pandemia
de Covid-19 na Assembleia Legislativa promoveu, nesta quarta-feira (24), uma
audiência pública para debater o retorno das aulas nas escolas públicas e
privadas. Conduzido pelo deputado Angelo Almeida (PSB), presidente do
colegiado, o evento reuniu representantes das secretarias estaduais de Educação
(SEC) e de Saúde (Sesab), além de professores, alunos, dirigentes sindicais,
mães e pais de estudantes, vereadores de alguns municípios, entre outras
representações.
Para Angelo Almeida, a discussão do cenário para voltas às
aulas em meio à pandemia requer um esforço conjunto entre todos os atores
envolvidos na comunidade escolar. “Nosso objetivo aqui é ouvir e levar as
abordagens apresentadas para as autoridades, para que os apelos sejam ouvidos.
Neste momento, é importante a união de todos no combate à Covid-19, e considero
o ponto mais relevante para evitar e prevenir as mortes”, assinalou o
presidente, que sugeriu, ao fim do debate, a criação de um fórum multissetorial
para discutir o melhor caminho em direção a um entendimento.
O encontro foi iniciado com a apresentação feita pelo
subsecretário de Educação da Bahia, Danilo Melo. O gestor representou o
secretário titular da pasta, Jerônimo Rodrigues, que não pode participar do
evento em decorrência de outro compromisso na agenda. Em sua explanação, Melo
ressaltou que o momento pandêmico é um período de excepcionalidade, “uma
situação de guerra”, como bem definiu. Ao informar o plano de retomada das
atividades escolares, o subsecretário mostrou que o objetivo é cumprir a carga
horária de 1.500 horas, até 31/12/21, relativa aos anos letivos de 2020 e 2021.
Para atingir a referida meta, a Bahia decidiu por planejar a
volta do ano letivo em três fases: remota, híbrida e presencial. De acordo com
Danilo Melo, a forma remota está prevista para ter início em 15 de março. “Essa
modalidade terá a disponibilização de materiais e livros digitais, salas
virtuais do Google, além da novidade que é o novo canal da TVE, o Educa Bahia,
que estreará em 1º de março e terá programas voltados para os ensinos
fundamental e médio”, contou o dirigente.
Na fase híbrida, a previsão é que as aulas ocorram três dias
em sala de aula e outros três dias com atividades remotas. Na etapa presencial,
os seis dias de aulas serão em sala de aula. Danilo Melo explicou que não há
data estipulada para que estas duas fases sejam implementadas, pois dependem da
melhora dos indicadores relacionados à situação da Covid-19. ?Todos nós estamos
observando o esforço do governador Rui Costa para ofertar vacina a todos os
baianos. Assim, cabe ressaltar que a retomada presencial depende dessa
segurança e protocolos para todos os envolvidos?, afirmou.
Neste momento, conforme mostrou o subsecretário, o
calendário da rede estadual de ensino já definiu que as atividades docentes de
preparação do ano letivo iniciarão no dia 1º de março, com a jornada pedagógica
programada para ocorrer entre os dias 8 e 12, e início das aulas remotas no dia
15 do mesmo mês.
Em seguida, a audiência pública ouviu a coordenadora do
Centro de Operações de Emergência em Saúde do Estado, Izabel Marcílio. A médica
sanitarista apresentou dados sobre a situação epidemiológica da Covid-19 na
Bahia até esta semana, como o aumento na ocupação dos leitos de UTI, crescimento
nos índices de novos casos e saturação no sistema de regulação de pacientes com
sintomas da doença.
Segundo a coordenadora, a taxa de ocupação de leitos de UTI
é 82%. “É um número bastante alto, muito além do que a gente considera
seguro. Isso mostra a situação que a gente está vivendo”, alertou,
lembrando, como exemplo, que há um crescimento acelerado na ocupação de leitos
para pacientes com coronavírus na rede privada em Salvador.
Os dados da mortalidade por Covid-19 também preocupam. Os
números mostrados por Izabel indicam que houve um pico de mortes em julho
(2.092) e agosto (1530), com redução entre outubro e novembro, quando foram
registrados 611 óbitos no Estado. O cenário voltou a ter crescimento a partir
de dezembro (931) e janeiro (1180). “Desde dezembro, esse número tem aumentado.
Todos os indicadores apontam para uma gravidade da situação com saturação do
sistema de saúde do Estado, correndo risco de culminar no colapso do setor e
consequente aumento da mortalidade”, frisou a médica.
A audiência pública contou com dirigentes de entidades
representantes da classe docente. O professor Rui Oliveira, coordenador geral
do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado da Bahia (APLB) lamentou,
por exemplo, as mortes de professores ocorridas com frequência por causa da
Covid-19. O dirigente também falou sobre a retomada das atividades escolares na
rede estadual de ensino. “Estamos tendo diálogo com o secretário de Educação,
mas não fomos contatados sobre essa decisão de começar o ano letivo em 15 de
março. Sempre defendemos que queremos trabalhar, o que precisa fazer é criar as
condições. Sabemos que a forma remota garante a segurança de toda a comunidade
estudantil, mas temos três observações: trabalhadores e trabalhadoras não
possuem formação adequada, temos preocupação com a acessibilidade dos alunos à
internet, e o Estado precisa garantir aos profissionais condições e estrutura
tecnológica para produzir o conteúdo”, enumerou Rui Oliveira.
Allysson Mustafá, diretor do Sindicato dos Professores no
Estado da Bahia (Sinpro/BA), também apresentou suas observações. Para ele, é
importante que o governo oriente, com clareza, quais são as informações
esperadas para que se possa adotar a fase de ensino presencial. “É preciso
observar que as pessoas envolvidas na atividade escolar utilizam transporte
público, ficam expostas à contaminação. A preocupação não é apenas o ambiente
escolar. Há a falsa impressão de que as escolas particulares, todas elas,
possuem condições de segurança para retomada. Mas muitas não oferecem máscaras
aos trabalhadores, não cumprem protocolos, e pressionam por retorno de aulas.
Não se pode pensar de forma superficial, com foco apenas em alguns atores, há
uma complexidade nesse processo”, ressaltou Mustafá em sua fala.
Representando o movimento Volta às Aulas Salvador, a médica
Larissa Voss Sadigursky, também mãe de estudante, disse aos presentes na
audiência pública que o grupo defende o retorno seguro e facultativo das aulas
presenciais. “Não queremos obrigar ninguém a voltar, mas queremos o direito de
levar nosso filho à escola. Não somos negacionistas. Neste momento, entendemos
que, em especial Salvador, passa por um momento delicado, tirando a
possibilidade da volta às aulas presenciais. Mas até hoje a Bahia não
estabeleceu, de forma clara e objetiva, quais são os critérios que são
necessários para retomada das aulas presenciais”, disse Larissa, se juntando ao
argumento apresentado por outros participantes.
Presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do
Estado da Bahia (Sinepe/BA), Jorge Tadeu Pinheiro Coelho lembrou que ainda em
março do ano passado, quando houve a declaração internacional da pandemia, um
grupo de professores da rede particular lançou a discussão sobre o que fazer
para levar a educação às pessoas. “O trabalho funcionou com muita luta, mas o
desafio por fazer o ensino remoto funcionar foi muito grande”. De acordo com
Jorge Coelho, um detalhe incomodou durante a caminhada: ?Ao longo desse
processo, o que nos incomodou muito foi que a educação teve que se impor para
ser ouvida?. O dirigente do sindicato ainda manifestou sua preocupação com o
fechamento de algumas unidades escolares e com a demissão de trabalhadores. “O
salário dos professores é pago com as mensalidades dos alunos. Estamos
demitindo pessoas outras que não são professores. Isso está acontecendo, é
lamentável”.
Presente ao encontro virtual, o presidente do Conselho
Estadual de Educação, Paulo Gabriel, falou da sua visão para o ‘novo normal’. “Vamos vivenciar uma crise educacional em que as classes média e alta vão
crescer, enquanto as classes populares vão cair. A gente precisar assumir algo
para diminuir esse fosso, que já era grande e vai continuar crescendo. Vamos,
sim, sobreviver a essa pandemia. Os esforços estão sendo colocados pelo
governo”, apostou.
Durante o evento, representantes da sociedade civil também
tiveram direito à fala. Foi o caso do professor de educação física Tiago
Pascoal, integrante Conselho Municipal de Saúde de Ilhéus. O docente afirmou
que, na sua opinião, é impossível pensar no retorno presencial das aulas neste
momento. Ele defende que está na hora de as escolas buscarem uma nova forma de
fazer educação.
“Por que o Estado ainda não pensou em um grande plano de
acessibilidade às tecnologias de informação? Grande parte da zona rural da
Bahia já possui eletricidade”, apontou. Em seguida, a professora Estela, mãe de
estudante em Salvador, relatou ter encontrado dificuldades para obter
informações a respeito do futuro dos alunos concluintes do ensino fundamental. “Quem está nas turmas finais não teve assistência. Penso que ano passado
pecaram muito na comunicação com as famílias”, disse. Estela concordou com o
fato de que as aulas remotas são essenciais neste momento, mas pediu que o
poder público estimule o acesso à tecnologia entre os estudantes.
Outra mãe, que se identificou como Suellen, chamou a atenção
para um problema que considera importante, mas que não tem obtido o devido
olhar. Ela possui uma criança com deficiência em uma escola particular e conta
que ?não tem condição nenhuma? de estudantes com deficiência assistirem as
aulas remotamente. “Essa é uma falha que não está sendo tratada por ninguém”,
lamentou.
PARTICIPAÇÃO DE PARLAMENTARES
A audiência pública teve a contribuição de legisladores, a
exemplo da deputada Mirela Macedo (PSD), integrante da comissão especial
organizadora do debate. “2020 foi um ano de muita angústia para todos os
participantes da rede pública. Essa angústia ainda está latente porque não
existe algo muito concreto sobre o que vai acontecer. Por isso é importante
debater e ouvir os questionamentos sobre o ensino público em diversas partes da
Bahia”disse a parlamentar.
Também integrante do colegiado especial, o deputado Tiago
Correia (PSDB) afirmou que está preocupado com ?a falta de planejamento do
Governo do Estado. O ano de 2020 foi perdido para os estudantes baianos da rede
estadual. O governo não se mostrou, desde o início da pandemia, aberto ao
diálogo para construir o protocolo necessário ao retorno das aulas?, apontou.
Presidente da Comissão de Educação, Cultura, Ciência,
Tecnologia e Serviços Públicos, a deputada Fabíola Mansur (PSB) foi clara ao
dizer que, com o quantitativo de leitos ocupados, não se pode pensar em
atividades presenciais. “Esse programa de retomada com aula remota foi
construído junto à comunidade escolar. O governo se preocupou muito com a
necessidade de a aprendizagem ser mais uniforme em um estado tão desigual como
o nosso. As escolas, às vezes, têm condições de retornar, mas estamos vendo
índices muito ruins”, contextualizou a deputada.
Ex-senadora e deputada federal da Bahia pelo PSB, Lídice da
Mata marcou presença no debate. “Nós, como agentes públicos, temos obrigação de
discutir esse problema. Estamos abrindo esse espaço de debate fundamental para
a discussão das consequências tão nefastas da pandemia na população brasileira.
Na medida em que se abre o debate público, damos um passo muito importante”,
considerou. Para a congressista, um detalhe não pode ser ignorado nesse
contexto: a dificuldade enfrentada por muitos estudantes no estado. “Muitas
vezes, eles não têm tranquilidade e espaço para fazer o seu aprendizado permanente”.
Além dos parlamentares acima citados, estiveram presentes os
deputados Bira Corôa (PT), Jacó (PT), Maria del Carmen (PT), Fátima Nunes (PT)
e Vitor Bonfim. (Agencia Alba).
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