Bolsonaro acusa Barroso de ‘militância política’ por CPI da Covid e cobra impeachment de ministros

Em uma reação ao novo revés sofrido no Supremo Tribunal
Federal, o presidente Jair Bolsonaro acusou nesta sexta-feira, 9, o ministro
Luís Roberto Barroso de “militância política” e “politicalha” por ter determinado a abertura de uma Comissão
Parlamentar de Inquérito para investigar a atuação do governo na pandemia.

Em postagem nas suas redes sociais, o presidente afirmou que
falta “coragem moral” ao ministro por se omitir de também ordenar a
abertura de processos de impeachment contra integrantes da Corte.

“A CPI que Barroso ordenou instaurar, de forma
monocrática, na verdade, é para apurar apenas ações do governo federal. Não
poderá investigar nenhum governador, que porventura tenha desviado recursos
federais do combate à pandemia”, postou Bolsonaro em suas redes sociais. “Barroso se omite ao não determinar ao Senado a instalação de processos de
impeachment contra ministro do Supremo, mesmo a pedido de mais de 3 milhões de
brasileiros. Falta-lhe coragem moral e sobra-lhe imprópria militância
política.”

Barroso ordenou ontem que o Senado instale a chamada “CPI da Covid”, que tem o apoio de mais de um terço dos senadores, mas
sofria resistência do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), aliado do
Palácio do Planalto. A exemplo da CPI, a análise sobre pedidos de impeachment
de ministros do STF cabe ao Senado e depende de aval de Pacheco.

Ao falar com apoiadores, na saída do Palácio da Alvorada,
Bolsonaro adotou um tom ainda mais duro, e acusou o magistrado de promover uma “jogadinha casada” com a oposição ao seu governo. “Uma jogadinha
casada entre Barroso e bancada de esquerda do Senado para desgastar o governo.
Eles não querem saber o que aconteceu com os bilhões desviados por alguns
governadores e uns poucos prefeitos também”, afirmou o presidente.

“Barroso, nós conhecemos seu passado, sua vida, como
chegou ao Supremo Tribunal Federal, inclusive defendendo o terrorista Cesare
Battisti (italiano extraditado em 2019 após ser condenado por homicídios em seu
país). Use a sua caneta para boas ações em defesa da vida e do povo brasileiro,
e não para fazer politicalha dentro do Supremo”, completou o presidente,
cobrando a abertura de impeachment contra ministros da Corte.

A criação da CPI da Covid preocupa Bolsonaro por aprofundar
o desgaste do governo em um momento de queda de popularidade de Bolsonaro e de
agravamento da pandemia. Uma vez criada, a comissão poderá convocar autoridades
para prestar depoimentos, quebrar sigilo telefônico e bancário de alvos da
investigação, indiciar culpados e encaminhar pedido de abertura de inquérito
para o Ministério Público. Veja perguntas e respostas sobre a CPI da Covid.

Conforme dados reunidos pelo consórcio de veículos de
imprensa, divulgados na noite de ontem, o Brasil registrou 4.190 novas mortes
em decorrência da covid-19 nas últimas 24 horas. O número é equivalente a 174
mortes por hora. Foi a segunda vez que o País superou a marca de 4 mil vítimas
em um único dia. O total de mortes na pandemia chegou a 345.287.

A reação agressiva de Bolsonaro contra Barroso remete aos
embates ocorridos no ano passado, quando o STF impôs diversas derrotas ao
Palácio do Planalto, revogando atos e até a tentativa de nomear o delegado
Alexandre Ramagem, amigo da família presidencial, como diretor-geral da Polícia
Federal. A nomeação foi anulada na época pelo ministro Alexandre de Moraes.

O Supremo já abriu uma investigação relacionada à atuação do
governo na pandemia. Um inquérito apura se houve omissão do então ministro da
Saúde, Eduardo Pazuello, na crise que levou o sistema de saúde de Manaus (AM)
ao colapso no início do ano, quando pacientes morreram asfixiados por falta de
estoque de oxigênio nos hospitais. O caso foi enviado para a Justiça Federal do
Distrito Federal após Pazuello deixar o cargo e perder o foro privilegiado.

A decisão de Barroso foi tomada no mesmo dia em que o
Supremo frustrou novamente as pretensões do Planalto, ao permitir que
governadores e prefeitos de todo o País proíbam a realização de missas e cultos
presenciais na pandemia. Bolsonaro é crítico a medidas de restrições adotadas
para conter a propagação da covid-19.

Além disso, o Supremo já havia imposto uma série de derrotas
a Bolsonaro em ações relativas ao enfrentamento da pandemia. Foi assim, por
exemplo, ao garantir a Estados e municípios autonomia para decretar medidas de
isolamento social, decidir a favor da vacinação obrigatória contra a covid-19 e
mandar o governo detalhar o plano nacional de imunização contra a doença.

Pedido da oposição. A decisão de Barroso atendeu a pedido
formulado pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Jorge Kajuru
(Cidadania-GO), que contestaram a inércia de Pacheco, que segurou por 63 dias o
requerimento pelo início da investigação. Eles reuniram a assinatura de 32
parlamentares em apoio à CPI, mais do que o mínimo de 27 assinaturas
necessárias.

“O perigo da demora está demonstrado em razão da urgência na
apuração de fatos que podem ter agravado os efeitos decorrentes da pandemia da
covid-19”, observou Barroso em sua decisão. “Ressalto que é incontroverso que o
objeto da investigação proposta, por estar relacionado à maior crise sanitária
dos últimos tempos, é dotado de caráter prioritário”, disse. O ministro
submeteu a liminar para análise dos demais integrantes da Corte. O julgamento
está previsto para começar no dia 16 de abril no plenário virtual do STF, uma
ferramenta digital que permite julgar sem que os ministros se reúnam
presencialmente.

Um ministro do Supremo ouvido reservadamente pela reportagem
concordou com a decisão de Barroso e avaliou que a posição pacífica do Supremo
é de que é direito da minoria a abertura de uma CPI, se ela tiver objeto
específico e um terço de assinaturas, como houve.

O decano da Corte, ministro Marco Aurélio Mello, considerou
a medida “importantíssima”. “Porque precisamos realmente apurar a
responsabilidade quanto ao procedimento, quanto ao atraso em tomada de
providências.”

Pacheco criticou ontem a decisão judicial determinando a
instalação da CPI, mas disse que pretende cumprir a ordem. Para cumprir a
determinação de Barroso, o próximo passo do Senado é a leitura do requerimento
de abertura da CPI, o que deve ocorrer na semana que vem. O colegiado será
formado por 11 senadores titulares e sete suplentes, que serão indicados pelos
partidos. O prazo de duração da comissão é de 90 dias, podendo ser prorrogado
pelo mesmo período. (Estadão).

Foto: André Dusek/Estadão

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