O desfile bélico na Praça dos
Três Poderes, na manhã desta terça-feira, 10, serviu para aumentar o racha no
Centrão sobre a proposta de emenda constitucional que institui o voto impresso
nas eleições de 2022. Se na comissão especial da Câmara que analisou a proposta
já se podia verificar a divisão da base governista, depois que tanques se
exibiram nos arredores do Congresso o quadro só piorou. A tendência é que o
Palácio do Planalto sofra agora uma derrota maiúscula no plenário da Câmara.
Até mesmo o Progressistas,
partido do presidente da Câmara, Arthur Lira (AL) e do ministro da Casa Civil,
Ciro Nogueira, apresentava divisões. Antes da votação, vários deputados de
partidos da esquerda à direita se reuniram e discutiram a importância de dar
uma resposta “à altura” ao que classificaram como uma afronta ao Congresso.
Lira também promoveu um encontro
com líderes de bancadas na residência oficial da Câmara. Disse que o presidente
Jair Bolsonaro havia lhe garantido que aqueles exercícios militares não tinham
qualquer relação com a análise do voto impresso. Admitiu, no entanto que, com o
clima polarizado, o ato acirrou os ânimos e jogou mais combustível na crise. “Mas o que é preciso, neste momento, é que não haja nem vencidos nem
vencedores”, afirmou Lira.
A ordem política para a Marinha
desviar seus tanques e lançadores de mísseis para a Praça dos Três Poderes e a
Esplanada dos Ministérios, porém, partiu do próprio Bolsonaro e do ministro da
Defesa, Walter Braga Netto, como mostrou a colunista Eliane Cantanhêde. No
Congresso, antes mesmo da votação desta terça-feira, não eram poucos os que
diziam ser necessário “deter” Bolsonaro, mesmo no Salão Azul, onde a bandeira
do voto impresso ainda não chegou. ?Não haverá voto impresso. Não haverá golpe
contra a nossa democracia. Instituições, Congresso à frente, não permitiriam”,
disse o presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM).
O Estadão apurou que o ministro
Ciro Nogueira pediu a Bolsonaro para não esticar a corda, caso a proposta seja
derrotada na Câmara, como tudo indica. Ciro defendeu a pacificação até mesmo para
construir apoio a outras propostas de interesse do governo, como a reforma
tributária. Quem conhece o chefe do Executivo, no entanto, assegura que ele não
vai se calar, até mesmo porque, até 2022, há muito tempo para renovar as
ameaças golpistas. E, além disso, o Planalto avalia que, mesmo sofrendo mais um
revés, ganhou o discurso nas redes sociais e, de quebra, semeou uma dúvida na
cabeça de eleitores o sobre a idoneidade das urnas eletrônicas.
Nos últimos dias, Bolsonaro
xingou o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luis Roberto Barroso,
de “filho da p…” por sua posição contrária ao voto impresso; acusou fraudes
nas urnas eletrônicas sem apresentar quaisquer provas; afirmou que a ?hora? do
ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) ia chegar e
disse haver um “complô” para eleger o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
hoje líder nas pesquisas de intenção de voto, em 2022.
“Vamos votar contra o voto
impresso, tirar isso da frente e cuidar do que é importante para o Brasil. E o
que é importante para o Brasil é vacina, emprego, comida, combate à inflação e
retomada da indústria”, insistiu o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos
(PL-AM), em campanha pela derrota do governo na votação desta terça-feira.
(Vera Rosa – Estadão)
Foto: Gabriela Briló/Estadão