Correndo por fora: Abandonado por Lula nas questões econômicas, Alckmin se aproxima da direita e militares

Com uma atuação pública discreta,
o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) vem se tornando um canal de diálogo do
governo com alguns setores mais refratários ao PT, como militares,
representantes do agronegócio e parlamentares da oposição.

Alckmin tem buscado se consolidar
como uma ponte do Executivo com camadas da sociedade mais críticas à esquerda.
Aliados dizem que essa atuação é a estratégia dele para manter protagonismo na
gestão petista, uma vez que não participa do centro de poder do governo
?concentrado na Casa Civil? ou da formulação da política econômica, algo que
ocorre principalmente no Ministério da Fazenda.

O vice-presidente manteve apenas
três despachos oficiais com Lula em 45 dias de governo, segundo a agenda do
mandatário. Mas interlocutores do vice-presidente, que também é ministro do
Desenvolvimento Indústria, Comércio e Serviços, ressaltam que os dois conversam
também por telefone pelo menos uma vez por semana.

Governador de São Paulo por
quatro mandatos, Alckmin deixou o PSDB e se filiou ao PSB para viabilizar a
aliança eleitoral com Lula. A ida do ex-tucano para a chapa petista fez parte
do plano de Lula para reduzir resistências ao PT no setor produtivo e se
aproximar do centro e da centro-direita.

Após a vitória, Lula indicou
Alckmin para ser o coordenador-geral do governo de transição. Havia uma
especulação de que o posto poderia ser ocupado por Gleisi Hoffmann, presidente
nacional do PT; ou ainda por Aloizio Mercadante, hoje presidente do BNDES e que
coordenou o plano de governo petista.

 Pouco depois, o vice foi
anunciado como ministro.

Alckmin esteve ao lado de Lula na
reunião com governadores logo após os ataques golpistas de 8 de janeiro; também
participou da primeira reunião ministerial do governo e do segundo encontro com
os chefes dos Executivos estaduais.

Nesse terceiro evento, Lula fez
uma brincadeira com o fato de Alckmin não ter sentado em sua cadeira no
gabinete presidencial quando o mandatário viajou para Argentina e Uruguai.

Alckmin justificou a pessoas
próximas que tampouco se sentou na cadeira do então governador Mário Covas
(PSDB) quando era vice em São Paulo e precisava ocupar o cargo interinamente,
de 1995 a 2001.

A relação de Lula com os
militares está estremecida desde antes da posse. Parte significativa de
oficiais e da tropa é crítica ao PT, enquanto o presidente e aliados desconfiam
de um setor que consideram contaminado politicamente pelo bolsonarismo.

O próprio ministro da Defesa,
José Múcio, chegou a afirmar que o mandatário estava com dificuldades para
virar a página.

Nesse sentido, o ministério
comandado por Alckmin virou uma ferramenta para tentar distensionar a relação
com a caserna. Lula passou a tratar com os comandantes sobre projetos
estratégicos para as Forças Armadas e escalou a pasta do Desenvolvimento
Indústria, Comércio e Serviços para coordenar a participação da iniciativa
privada nessas ações.

Na primeira viagem internacional
de Lula, uma das agendas de Alckmin como presidente interino foi justamente
acertar com Múcio e os comandantes militares a criação de um comitê de investimentos
para os projetos estratégicos das Forças.

A questão ganhou destaque dentro
do ministério de Alckmin, que passou a manter contato direto com Múcio e os
comandantes.

Dessa forma, o vice-presidente
reforçou o canal de diálogo entre o Planalto e os militares. Aliados de Alckmin
afirmam que está sendo construída uma relação de confiança.

O vice também mantém aberto o seu
gabinete para políticos de diferentes correntes ideológicas, incluindo a
oposição. Recebeu, por exemplo, os governadores bolsonaristas Marcos Rocha
(União Brasil-RO) e Jorginho Mello (PL-SC).

Também houve reunião com o
ex-líder do governo Bolsonaro na Câmara Ricardo Barros (PP), que atualmente é
secretário da Indústria, Comércio e Serviços do Paraná.

O vice-presidente teve atuação
forte neste início de mandato para fortalecer a bancada no Senado do seu
partido, o PSB, e consequentemente ampliar o arco de alianças do governo.
Ajudou a trazer para o partido nomes que eram ligados a Bolsonaro, como o
ex-vice-líder do governo Chico Rodrigues (RR); e outros que tinham uma atuação
mais independente, como Flávio Arns (PR) e Jorge Kajuru (GO).

Em outra frente, Alckmin está
abrindo canais com o agronegócio, que apoiou amplamente Bolsonaro e teve
empresários acusados de financiar atos golpistas.

A aproximação inicial de Lula com
o setor esteve a cargo de Carlos Fávaro, atual ministro da Agricultura. No
entanto, interlocutores do governo apontam que Alckmin também está
intensificando a aproximação com o agronegócio, principalmente a produção mais
voltada para exportação.

Apontam nesse sentido o diálogo e
a intensificação de ações e projetos para tratar da questão dos fertilizantes,
que se tornou um problema com a guerra entre Rússia e Ucrânia, dois
exportadores do produto.

Além disso, Alckmin preside a
Cosban (Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação),
principal mecanismo de coordenação institucional da relação Brasil-China. O
país asiático é o principal parceiro comercial do país e destino prioritário do
agronegócio brasileiro.

Crédito: Folha de S. Paulo.

Foto: Divulgação/Terra Brasil