A advocacia, historicamente, sempre foi colocada à prova nos
momentos mais turbulentos de nosso país. A sociedade brasileira, muitas vezes,
não consegue observar a máxima de que não pode ser atribuída ao advogado a
acusação da qual é alvo o seu cliente. Em tempos como os atuais, nos quais a
população vai às ruas cobrar a limpeza das instituições e o combate à
corrupção, o advogado é visto com desconfiança ao defender acusados de sangrar
o erário. Aos olhos do leigo, a advocacia parece legitimar o ato do acusado.
Mas essa visão é bastante equivocada. O advogado é o
responsável por garantir um julgamento justo. Na verdade, a plena atuação do
advogado legitima até mesmo a mais rigorosa condenação, porque a advocacia traz
a garantia de que houve o respeito ao devido processo legal. Trata-se de uma
profissão de fé e coragem, construída a partir de muito estudo, sabedoria,
ética e com uma indispensável vocação de defesa da ordem jurídica e da
sociedade.
O advogado criminalista, em especial, tem sido injustamente
vilipendiado. Preocupa o fato de a sociedade, insuflada muitas vezes pelos
próprios atores do processo, ver no direito de defesa e nos recursos contra
decisões judiciais um caráter meramente protelatório, como se fossem usados com
o único objetivo de adiar o desfecho das decisões.
O direito à defesa é mais do que uma conquista social.
Trata-se de um avanço civilizatório conquistado à custa de muitas injustiças
cometidas contra aqueles que não tiveram espaço para expor suas defesas. Para
garantir que isso não aconteça mais é que existem os recursos, e os advogados
treinados para bem defender seus clientes. É papel da advocacia exigir respeito
ao trabalho dos profissionais que representam acusados.
As prerrogativas advocatícias não pertencem ao advogado, mas
sim a toda a sociedade, na busca da verdade real e da proteção ao direito à
ampla defesa insculpido na Constituição de 1988. Crimes, por óbvio, devem ser
esclarecidos e seus autores devidamente punidos, na medida de seus atos. Mas
para legitimar a ação do Estado é necessário que o acusado tenha respeitados
seu direito de contestar as provas, sem que isso seja visto como uma afronta ao
trabalho de membros do Ministério Público ou de juízes.
Não é por acaso que o exercício da advocacia ultrapassa a
mera atividade mercantil, conforme consta no artigo 133 da Constituição
Federal: [O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo
inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites
da lei]. O advogado é o primeiro juiz da causa e o profissional por meio do
qual cidadãos podem se defender de possíveis abusos da máquina estatal e fazer
valer o Estado Democrático de Direito.
O advogado é responsável por cuidar da liberdade, da honra,
do patrimônio e da própria vida das pessoas. Sua função é pública, muito mais
do que privada. Por isso, um ataque aos advogados encerra, na verdade, um
ataque a todos os cidadãos. As prerrogativas do advogado são, mais do que
garantias para o exercício da profissão, um direito para que cidadãos possam
usufruir de seus direitos. É preciso conscientizar a sociedade da importância
de nossa profissão no arcabouço institucional. Que todos aqueles que cometam
crimes sejam devidamente punidos, mas com o pleno e absoluto respeito ao devido
processo legal ? que não é possível de ser obtido sem a participação
independente de um advogado.
Ibaneis Rocha é
presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal
(OAB/DF)