A Comissão Parlamentar de
Inquérito (CPI) que apura os atos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) aprovou um requerimento para convocar o ministro da Casa Civil, Rui
Costa. O pedido não estava na pauta até o começo da sessão e foi articulado
pela bancada ruralista momentos antes. A solicitação é do próprio relator do
colegiado, Ricardo Salles (PL-SP).
Na justificativa, o deputado pede
explicações de Costa sobre o “incremento no número de invasões de
propriedade e destruição do patrimônio público e privado no país”.
Para Salles, a postura do governo
é de conivência com as ocupações feitas pelo MST, “seja por se associar a
seus líderes, seja por indicar gestores, em vários níveis, ligados àqueles que
promovem invasão”.
“Não sem razão, o presidente
da República se fez acompanhar, em viagem oficial à República Popular da China,
do senhor João Pedro Stédile”, afirma um trecho do documento, em
referência ao líder do MST. “Não sem razão, nomeou para vários cargos no
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) pessoas ligadas às
invasões, bem como nomeou como ministro o senhor Rui Costa que, durante seu
mandato como governador do estado da Bahia, não empreendeu esforços para
impedir atos de invasões de terra nem para garantir a propriedade
privada”, acrescentou.
Na última sessão do colegiado
antes da pausa nas atividades legislativas, em 11 de julho, a pequena parcela
de integrantes governistas da comissão articulou para que Rui Costa não fosse
convocado, mas o presidente da CPI, Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS),
deixou no ar que a questão ficaria para o retorno aos trabalhos. Na ocasião,
foi aprovada a convocação do depoente desta terça-feira, general Gonçalves
Dias, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
A comissão retornou do recesso
parlamentar fortalecida pelas recentes ações do MST, em especial a ocupação de
uma fazenda da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em
Petrolina (PE), no domingo, episódio que pode ter dado força à convocação do
chefe da Casa Civil.
Deputados governistas usaram de
questões de ordem para tentar contornar a votação do pedido. Alencar Santana
(PT-SP) tentou, inclusive, usar o mau funcionamento do cronômetro do plenário,
que auxilia no tempo de fala dos deputados, para suspender a reunião e não
votar o requerimento.
“A tentativa de convocar o
ministro Rui aqui para esta CPI mostra claramente que a intenção dos
parlamentares que coordenam a comissão, e que são maioria, é atacar o governo
para intimidar”, criticou o deputado Nilto Tatto (PT-SP).
Ditadura
A sessão para o depoimento de
Gonçalves Dias foi marcada por tumultos entre parlamentares, incluindo
discussão sobre ditadura militar.
Salles questionou se G. Dias era
“a favor ou contra a ação de 1964”. A pergunta provocou irritação
entre os parlamentares e gritos pedindo respeito.
“Ricardo Salles está
cometendo crimes, ele acabou de elogiar uma ação golpista que deixou milhares
de mães chorando e, até hoje, não sabem o paradeiro de seus filhos”,
ressaltou a deputada Sâmia Bomfim (PSol-SP).
A deputada Talíria Petrone
(PSol-RJ) acrescentou: “Sou neta de um homem que foi torturado, e para o
senhor estar aí nessa cadeira rindo com deboche muita gente lutou para garantir
esse Estado Democrático de Direito”.
Mesmo com pedidos para que a
pauta seguisse adiante, Salles retornou à pergunta sobre o golpe militar
alegando que seria a primeira vez na história que alguém do Exército nega ter
se tratado de uma “revolução”. O general, no entanto, respondeu que
esse não era o tema de sua convocação.
Indagado se sabia de invasões do
MST no período em que foi ministro do GSI, G. Dias negou. Salles rebateu: “Não é ministério de porcelana, de andar de bicicleta, é de
segurança”.
“Estávamos em processo de
transição, a Abin tinha de monitorar, mas na passagem da transição não recebi
nenhuma informação”, declarou o general.
Apesar de não ser o foco da
oitiva, o vídeo em que G. Dias, então ministro do GSI, aparece interagindo com
invasores do Planalto, em 8 de janeiro, foi mencionado na sessão. O deputado
Messias Donato (Republicanos-ES) perguntou ao general se as “imagens são
mentirosas?”. O militar respondeu: “Não é objeto desta
investigação”.
Já Éder Mauro (PL-PA) declarou: “Até onde o MST não participou do 8 de janeiro?”. Ele acrescentou que
os ataques foram um “plano comunista para colocar nas costas dos nossos
patriotas”.
O parlamentar levou uma melancia
à sessão e começou a comê-la assim que G. Dias iniciou o depoimento. A fruta
virou um símbolo político para aqueles que são “verdes por fora”, ou
seja, militares, e “vermelhos por dentro”, em alusão ao comunismo. (Ândrea
Malcher/Mayara Souto/Correio Brasiliense).
Foto: Casa Civil/BR/Flickr