Após o Comitê de Política
Monetária (Copom), do Banco Central, anunciar, ontem, uma redução da taxa
básica da economia (Selic) acima do esperado pela maioria do mercado, analistas
começaram a refazer as previsões. A mediana das estimativas para os juros
básicos no fim deste ano, atualmente em 12%, tende a ficar cada vez mais perto
de 11% anuais.
O Copom reduziu, nesta
quarta-feira (02/08), a Selic em 0,50 ponto percentual, para 13,25% ao ano,
marcando o início de um novo ciclo de queda dos juros básicos, que estavam
13,75% anuais desde agosto de 2022. A decisão não foi unânime, mas o BC
sinalizou que haverá consenso para novos cortes da mesma magnitude nas próximas
reuniões.
Esse recado – apesar de o placar
apertado de 5×4 -, deixou analistas mais otimistas e esperando uma reação
positiva do mercado financeiro nesta quinta-feira (03/08). O EZW, índice de
fundo negociado em Nova York que reflete o comportamento de ações do Índice
Bovespa – principal indicador da Bolsa de Valores de São Paulo (B3) – registrava alta de 1,30% após o fechamento com queda de 0,75%.
Outro motivo para essa visão mais
otimista foi o fato de o presidente do BC, Roberto Campos Neto, ter votado pelo
corte de 0,50 ponto percentual na Selic, em linha com os dois novos diretores
indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Gabriel Galípolo
(Política Monetária) e Ailton de Aquino Santos (Fiscalização).
“Era possível uma redução de 0,50
ponto percentual na Selic. Isso não era impossível de acontecer. Mas o
interessante da decisão foi que, apesar da divergência nos votos, agora, há uma
unanimidade em torno de 0,50 ponto a partir da próxima reunião. Isso
distensiona e coloca bastante tranquilidade pelo que vem pela frente”, destacou
Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.
Trégua política
Na avaliação dele, o BC pode,
agora, deixar de lado a tensão que havia no primeiro semestre, sem ter um “risco técnico”. “O nosso cenário para a Selic no fim deste ano era de 12,25%
e, agora, passa para 11,75%, mas mantemos a projeção de 9,25% para o fim do ano
que vem. E, agora, espero uma relação mais tranquila entre governo e BC do que
foi no primeiro semestre”, acrescentou.
“A briga, agora, vai ser
interessante sobre o final do processo de redução dos juros, com mais dois
membros provavelmente heterodoxos podem acelerar a queda de juros e aí vamos
contratar problemas para 2025”, emendou Vale. Ele lembrou que os mandatos da
diretora de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos ,
Fernanda Guardado; e do diretor de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de
Conduta, Maurício Moura; terminam em dezembro deste ano.
“Campos Neto confirmou ser um bom
estrategista e preservar a reputação do Banco Central e evitar ruídos de
desgaste. Um membro técnico da diretoria, ou seja, ele próprio, votou e
desempatou a favor dos 0,50, o mesmo voto de Galípolo”, destacou Eduardo Velho,
economista-chefe da JF Trust. Ele aposta em novo corte de 0,50 ponto na Selic
na reunião de setembro, para 12,75%.
Rodrigo Romero, economista da
Levante Investimento, também demonstrou otimismo em relação à reação dos
mercados hoje. “O comitê reforçou a necessidade de manter uma política
monetária contracionista até a consolidação do processo de desinflação e
ancoragem das expectativas. Os mercados devem reagir bem, com impulso extra
vindo do voto favorável de Campos Neto na direção de um corte de 0,50 p.p e não
0,25p.p como era amplamente esperado pelo mercado, validando ainda mais a tese
de flexibilização nesse momento”, disse.
O economista-chefe do PicPay,
Marco Caruso, reconheceu que havia um consenso no mercado de que as condições
para o cortes de 0,25 ponto ou de 0,50 ponto na Selic estavam dadas, se não
fossem as críticas de Lula à autonomia do Banco Central – que acabaram
desancorando as projeções de inflação do mercado. “Hoje, as estimativas para a
inflação são muito parecidas com as do início de janeiro, antes das falas do
presidente”, destacou.
Arcabouço fiscal
Conforme dados do boletim Focus,
do Banco Central, a mediana das previsões para o Índice de Preços ao Consumidor
Amplo (IPCA) de 2023 e 2024 estão em 4,84% e 3,89%, respectivamente. Caruso,
contudo, reconheceu que há incertezas sobre como o governo vai conseguir
cumprir as metas previstas no novo arcabouço fiscal nos próximos anos, pois a
necessidade de novas receitas pode contribuir para pressões inflacionárias.
Além disso, é importante não descartar o impacto do fenômeno El Niño de alta
nos preços das commodities em 2024.
Na avaliação do economista-chefe
da Daycoval Asset, Rafael Cardoso, “não ficou muito claro” que o argumento
prevaleceu entre os diretores do BC para decidir pela queda de 0,50 ponto
percentual no próximo Copom, mas ele espera que o ritmo de redução seja mantido
nas próximas reuniões. A casa reduziu de 12% para 11,75% a previsão para a
Selic no fim deste ano e manteve em 9% a projeção para o fim de 2024
De acordo com André Perfeito,
ex-economista-chefe da Necton Investimentos, o afrouxamento final da Selic
deverá ser maior do que o mercado espera, devendo encerrar o ano em 11,75%.
?Fatalmente, o ciclo se encerra já no começo do ano que vem, quando a Selic
deve estar em 10,75%, taxa que ainda deve ser considerada contracionista. O
fato de Campos Neto e Galípolo terem votado juntos evita problemas de conflitos
internos na diretoria do Banco Central e na condução da política monetária?,
apostou. (Rosana Hessel e Edla Lula ? Correio Brasiliense).
Foto: Raphael Ribeiro/BCB