Com o objetivo de expor a
situação de vulnerabilidade dos povos indígenas na Bahia, diante dos casos de
violência que têm ocorrido com frequência em seus territórios, a Comissão de
Direitos Humanos realizou, nesta terça-feira (26), no Auditório Jornalista
Jorge Calmon, uma audiência pública que reuniu lideranças indígenas, gestores
públicos e legisladores. O evento foi proposto pelo deputado Hilton Coelho
(Psol), por demanda da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil
(Apib) e outras organizações do segmento.
Aberta pelo presidente da
comissão, Pablo Roberto (PSDB), ao lado da vice, Neusa Cadore (PT), e
coordenado por Hilton Coelho, a audiência teve a mesa composta por Dario
Pataxó, da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas
Gerais e Espi?rito Santo (Apoinme); Agnaldo Pataxó Hã-Hã-Hãe, coordenador do
Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (Mupoiba); Marcos
Kalil, procurador da República; Aléssia Tuxá, da Defensoria Pública da União;
Jerry Matalauê, coordenador de políticas para os povos indígenas da Secretaria
de Promoção da Igualdade (Sepromi).
Da mesa estendida, participaram
familiares de vítimas, entre eles Kãdara Pataxó, mãe do Gustavo, liderança
indígena jovem assassinado recentemente, aos 14 anos; Wagner Moreira, do
Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos; o Cacique Aruã,
coordenador regional do Sul da Bahia, da Funai; Bruno Marconi, da
superintendência da Polícia Federal.
Virtualmente, participaram a
deputada federal Célia Xakriabá (Psol/MG), presidente da Comissão da Amazônia e
Povos Originários da Câmara dos Deputados; e Kâhu Pataxó, do Conselho de
Indígenas da Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da
Bahia (Finpat), representando o Ministério dos Povos Indígenas (MPI).
Em sua fala, o proponente da
audiência enfatizou a situação da violação de direitos dos povos indígenas na
Bahia, como fato que tem impressionado o Brasil e os organismos internacionais.
Ele lamentou que, apesar de a Bahia ser o segundo estado brasileiro com a maior
população indígena (15%), também, o segundo em número de assassinatos de
lideranças, ainda não exista uma política de garantia da vida para estas
pessoas.
“Aqui na Bahia, especialmente o
povo Pataxó, tem sido muito agredido no Extremo Sul. Nós queremos dar essa
sinalização de que está tendo reação, a luta existe e que nós não vamos de
forma nenhuma nos calar diante desse absurdo”, avisou. Para Hilton, os
acontecimentos pedem uma resposta da Segurança Pública “mas, também, do ponto
de vista mais amplo da política para os povos indígenas, especialmente, na
questão da titulação de terras”.
Segundo o legislador, na Bahia,
80% dos territórios reivindicados pelos povos indígenas ainda não foram
titulados, “e isso abre uma situação de vulnerabilidade muito grande porque,
com a titulação, a grilagem de terras tende a ficar inibida. Então nós
precisamos apressar esse processo, nacionalmente e aqui na Bahia, que o Governo
do Estado atue de maneira vigorosa para garantir que isso aconteça”.
O deputado apontou as atividades
econômicas estimuladas pelo Governo da Bahia, sobretudo as iniciativas no campo
do agronegócio, da mineração e do turismo, como “vetores que se organizam de
maneira muito agressiva contra os povos tradicionais em geral e, especialmente,
contra os povos indígenas”. Ele sugeriu, ao poder público, mediação política
para a titulação das terras indígenas e diálogo democrático a respeito das
atividades econômicas citadas.
“Os povos indígenas são centrais
pra defesa da vida da própria humanidade, são eles, junto a outras comunidades
tradicionais, que fazem com que a gente consiga, minimamente, defender o meio
ambiente. Portanto, precisam ser reforçados e não agredidos como está
acontecendo de maneira tão incisiva, no estado da Bahia”, defendeu.
Entre os representantes
indígenas, Agnaldo Pataxó Hã Hã Hãe reforçou a necessidade de tornar pública a
violência contra o segmento no território baiano e que se faça justiça punindo
os assassinos. Na Bahia, mais de 291 mil indígenas estão distribuídos em 47
municípios e 32 territórios, muitos deles empurrados a viver em contexto
urbano, por causa de titulação de terra, o que também tem ocasionado uma
sequência de assassinatos de lideranças.
Para o coordenador do Mupoiba, a
demarcação da terra vai barrar a violência contra os indígenas. “Não
demarcando, os governantes do nosso país sinalizam que vale a pena grilar, que
vale a pena matar a terra indígena, e que o que fizerem com nós, indígenas, não
vai ter punição”, afirmou.
Entre os casos de violência mais
recentes, Agnaldo citou o assassinato de Gustavo Pataxó, no dia 4 de setembro
de 2022, na retomada do Vale do Cahy, na Terra Indígena (TI) Comexatibá, no
Extremo Sul da Bahia, e lamentou a leniência da justiça, já que os assassinos
continuam soltos.
Segundo ele, por conta da
violência e das ameaças, mais 50% das pessoas que estão sob a proteção da
justiça no Estado são líderes indígenas. “Então, nós precisamos dialogar com as
autoridades legislativas, judiciárias, gerar mensagem para o Executivo que não
dá mais. Estamos vendo os nossos jovens sendo assassinados, estamos perdendo
nossos jovens e precisamos que a Justiça tome providência e puna esses maus
elementos”, frisou.
Além de pedir por justiça, o
líder Pataxó solicitou respeito à população indígena na Bahia e no Brasil. “Nós
produzimos, nós preservamos o meio ambiente, ajudamos a produzir o oxigênio que
dá vida pra todos, nós precisamos ser respeitados”
Plano Integrado de Segurança
Representando a coordenação de
Assuntos Fundiários da Superintendência de Política para os Povos Indígenas, da
Secretaria Estadual de Promoção da Igualdade Racial, Carlos Eduardo Lemos falou
sobre as medidas da pasta para a solução do problema fundiário no Bahia, a
partir de uma força tarefa de enfrentamento à violência e investigação dos
crimes contra os povos indígenas e outros povos tradicionais, como comunidades
quilombolas, fecho de pasto, ciganos, envolvendo as forças de segurança do
Estado e, também, federais.
Sobre a expectativa de demarcação
de terra com a queda do marco temporal, o gestor anunciou em breve a titulação
da terra indígena do povo Pataxó, dependendo, apenas, da homologação da
Presidência da República e da publicação da portaria declaratória de terra
indígena Barra Velha do Monte Pascoal, “que passará de 8 mil a 52 mil hectares,
abrangendo um território bastante maior, fazendo justiça a essa dívida
histórica do Estado brasileiro”.
Carlos Lemos reforçou que há o
empenho do Estado, junto com o Ministério dos Povos Indígenas, para a rapidez
nas demarcações, mas alertou, também, que pode haver reação dos grupos
contrários, que tentarão conter os avanços. “Podem existir novos casos de
tentativas de ameaça e intimidação, mas o Estado se prepara para enfrentar
essas situações, através da criação de força-tarefa e da atuação do Plano
Integrado de Segurança para os povos e comunidades tradicionais”, adiantou. (Agencia Alba).
Foto: Paulo Mocofaya/Ascom Alba