Senado aprova renegociação de dívidas dos estados com a União

Com 70 votos a favor e 2
contrários, o Plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (14) o projeto de
lei complementar que cria um novo programa federal para que estados e Distrito
Federal possam renegociar dívidas com a União e pagar os débitos em até 30 anos
e com juros menores. Agora a proposta (PLP 121/2024) segue para análise e votação da Câmara dos
Deputados. As dívidas estaduais somam atualmente mais de R$ 765 bilhões – a
maior parte, cerca de 90%, diz respeito a quatro estados: Goiás, Minas Gerais,
Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

Em contrapartida ao alívio nas
contas, os estados terão que entregar à União alguns de seus bens e priorizar
mais investimentos em áreas como educação, saneamento e segurança. Também será
criado novo fundo federal para compensar os estados menos endividados. 

De autoria do senador Rodrigo
Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, o PLP 121/2024 foi aprovado na forma do
substitutivo apresentado pelo relator, o senador Davi Alcolumbre (União-AP),
atual presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Davi
promoveu algumas mudanças no texto original e acatou, total ou parcialmente,
mais da metade das 78 emendas apresentadas por senadores. Ele já havia
recebido, no dia anterior, os apelos da União e dos estados para ajustes no
texto. 

– A essência da proposta
apresentada é dar um caminho de saída para uma dívida quase que impagável (…)
A proposta é um esforço na construção de um instrumento que dê aos estados o
espaço para produzir as políticas públicas de impacto diretamente para a
população, criar o equilíbrio federativo, confiança entre a União e os estados
e formas de manter uma saúde fiscal e atingir o objetivo de sustentabilidade ao
longo prazo – afirmou Davi.

Propag

De acordo com o texto aprovado
pelos senadores, será criado o Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos
Estados (Propag) para promover a revisão dos termos das dívidas dos estados e
do Distrito Federal com a União. 

A proposta autoriza desconto nos
juros, dá prazo de 30 anos para pagamento (360 parcelas), abre a possibilidade
de os estados transferirem ativos para a União como parte do pagamento e cria
exigências de investimento em educação, formação profissional, saneamento,
habitação, enfrentamento das mudanças climáticas, transporte e segurança
pública como contrapartida. 

Pacheco afirma que o objetivo do
Propag é apoiar a recuperação fiscal dos estados e do DF, além de criar
condições estruturais de incremento de produtividade, enfrentamento das
mudanças climáticas e melhoria da infraestrutura, da segurança pública e da educação.

Foi retirado do projeto pelo
relator o prazo de adesão ao Propag até o final de 2024. O texto aprovado
determina prazo de adesão de 120 dias a contar da publicação da futura lei. O
ingresso no Propag será por pedido de adesão do estado que tiver dívidas com o
Tesouro Nacional. 

As atuais dívidas bilionárias de
estados com a União vêm de décadas de empréstimos e renegociações. Os estados
mais endividados, que estão no Regime de Recuperação Fiscal (RRF) criado em
2017, também poderão renegociar dívidas junto a instituições financeiras
públicas e privadas e a organismos internacionais multilaterais. 

Prioridades

Quem entrar no Propag terá que
garantir que o dinheiro economizado será investido, de maneira prioritária, em
educação profissional técnica de nível médio, em infraestrutura para
universalização do ensino infantil e da educação em tempo integral, em ações de
infraestrutura de saneamento, de habitação, de adaptação às mudanças
climáticas, de transportes ou de segurança pública. Os recursos não poderão ser
aplicados em despesas correntes ou para pagamento de pessoal.

Entrada

Como entrada da renegociação, os
estados poderão quitar de imediato parte das atuais dívidas transferindo para o
poder da União bens móveis ou imóveis, participações societárias em empresas,
créditos com o setor privado, créditos inscritos na Dívida Ativa da Fazenda
Estadual, dentre outros ativos.

Parcelas 

Serão 360 parcelas mensais
calculadas de acordo com a Tabela Price e corrigidas mensalmente. O estado
poderá fazer amortizações extraordinárias da dívida. Haverá redução dos valores
das parcelas ao longo dos primeiros cinco anos.

Durante a vigência do contrato,
será proibida a contratação de novas operações de crédito pelo estado para o
pagamento das parcelas da dívida refinanciada, sob pena de desligamento do
Propag. 

Também poderá ser desligado do
Propag o estado que atrase o pagamento das parcelas por três meses
consecutivos, ou por seis meses não consecutivos no prazo de 36 meses.

Taxa de juros

Será mantida a taxa de juros
atualmente cobrada pela União, correspondente ao Índice Nacional de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA) acrescido de 4% ao ano. Mas haverá descontos de acordo
com o montante da dívida que será quitado na entrada e outras regras fiscais e
financeiras específicas. Com isso, estados poderão alcançar taxas de juros de
IPCA mais 0%, 1% ou 2%.

– O pagamento do principal com o
IPCA mais 4% de juros, principalmente para os estados que estão no regime de
recuperação fiscal, é uma conta em que ninguém consegue ver efetivamente o
resultado desse pagamento, porque o valor principal e o juro vão para uma conta
única do Tesouro da União Federal, e praticamente não se consegue constatar o
retorno disso para esses próprios estados que contraíram essas dívidas com o
aval da União – disse o relator.

Fundo

O Fundo de Equalização Federal
receberá parte dos recursos economizados com o desconto de juros da
renegociação para investimentos em todos os estados e no DF. Outra parte do
dinheiro poderá ser integralmente aplicado em investimentos no próprio estado, ao
invés de ser pago como juros da dívida à União. No mínimo, 60% deverão ser
investidos na educação profissional e técnica.

Ou seja, parte dos recursos que
seriam pagos como juros à União serão aplicados diretamente no próprio estado e
outra parte será revertida ao Fundo de Equalização para investimentos em todos
os estados da Federação. 

Davi acatou emenda do senador
Marcelo Castro (MDB-PI) para que 80% dos recursos do fundo sejam
repartidos de acordo com os critérios do Fundo de Participação dos Estados
(FPE) e 20% ?pela relação da dívida consolidada com a receita corrente líquida?
do ente.

– Por que nós criamos esse fator?
É porque tem alguns estados que têm um FPE muito baixo; por exemplo, o Distrito
Federal tem 0,67%. Seria prejudicado, teoricamente, ou melhor, não seria
beneficiado. Mato Grosso tem 1,8%. Quando a gente faz essa relação, você
aumenta a participação de estados como Espírito Santo, que tem um FPE baixo,
Distrito Federal, Mato Grosso, Tocantins – explicou Marcelo Castro.

O senador Oriovisto Guimarães
(Podemos-PR) calculou em R$ 42 bilhões anuais o montante anual de que a União
abrirá mão em benefício do Fundo de Equalização, o que impactará o equilíbrio
fiscal do governo federal.

– Os estados resolvem todas as
suas dívidas. Os estados que não têm dívida passam a ter um fundo que vai
distribuir dinheiro para eles. Todo mundo sai ganhando. Será que ninguém perde?
Não tem perdedor? Se não tiver perdedor, é um milagre. Em economia, não existem
milagres – analisou Oriovisto.

Recuperação fiscal

O texto aprovado prevê exigências
de equilíbrio fiscal aos entes que aderirem ao Propag. Eles terão 12 meses para
instituir regras que limitem o crescimento de suas despesas primárias. 

Debate

O senador Flávio Bolsonaro
(PL-RJ) apoiou a aprovação por entender que os estados superendividados poderão
finalmente aliviar suas contas e “ter uma porta de saída, e não um paredão para
bater de frente”.

– Esse projeto de lei é, sem
dúvida alguma, uma grande “porta da esperança” para que possamos voltar a fazer
o dever de casa, honrar os compromissos do Rio de Janeiro, que quer pagar a sua
dívida, obviamente, com critérios que sejam minimamente razoáveis – disse
Flávio.

Na mesma linha, o senador
Castellar Neto (PP-MG) apoiou a aprovação e disse que o estado de Minas Gerais
é “assombrado com essa dívida ao longo dos últimos 30 anos”.

– Nós saímos daqui hoje, após um
longo trabalho, muito esperançosos de que os próximos anos para os estados,
especialmente aqueles que têm dívidas maiores, possam ser anos de mais
conquistas, de mais investimentos – disse Castellar.

Também apoiaram o projeto os
senadores Marcos Rogério (PL-RO), Paulo Paim (PT-RS), Zenaide Maia (PSD-RN),
Otto Alencar (PSD-BA), Dr. Hiran (PP-RR), Carlos Portinho (PL-RJ) e outros.

Pacheco agradeceu aos colegas
pela aprovação do projeto e pediu atenção e celeridade da Câmara dos Deputados
para votar o texto e encaminhar para sanção presidencial. Para ele, o projeto
vai proporcionar que estados recuperem suas capacidades de investimentos.

– Fico honrado de ser presidente
do Senado neste momento (…) e, como senador por Minas Gerais, externar minha
gratidão a todos os senadores e senadoras que compreenderam a importância do
princípio da colaboração federativa para o Brasil, mas sobretudo para os
estados endividados – disse. (Agência Senado).

Foto: Jefferson Rudy/Agencia Senado