O Plenário aprovou requerimento
para votar em regime de urgência o projeto de lei (PL 2.338/2023) que regulamenta o desenvolvimento e o uso de
sistemas de inteligência artificial (IA). A previsão inicial era que o texto
fosse analisado pelo Plenário ainda nesta quinta-feira (5), mas como alguns
senadores manifestaram dúvidas sobre o texto final, houve acordo para que a
votação ficasse para para a próxima terça-feira (10).
A matéria foi aprovada em votação simbólica na comissão
temporária criada para analisar a regulamentação da inteligência artificial e
foi considerada consensual pelos membros do colegiado. Eles elogiaram o texto
final apresentado pelo relator, senador Eduardo Gomes (PL-TO). O substitutivo
tem como base o PL 2.338/2023, apresentado pelo senador Rodrigo Pacheco
(PSD-MG), e engloba dispositivos sugeridos em mais sete propostas.
No entanto, a urgência para
votação em Plenário não foi consensual. Alguns parlamentares de oposição, como
os senadores Eduardo Girão (Novo-CE), Plínio Valério (PSDB-AM) e Jorge Seif
(PL-SC), defenderam mais tempo para analisar o texto, diante da importância do
tema e do seu impacto econômico e social. A dúvida, conforme os senadores, está
concentrada, basicamente, em dispositivos que possam restringir o direito à
liberdade de expressão no país.
Girão solicitou que seja
respeitado o prazo regimental de duas sessões subsequentes da sessão que
aprovou a urgência para que o projeto possa entrar na pauta.
– Se aprovada a urgência, que
seja colocado em duas sessões subsequentes da sessão ordinária, após a
aprovação, porque é um assunto extremamente polêmico, não é? A sociedade
brasileira nos cobra, de forma responsável, que a gente tenha um posicionamento
legítimo contra a censura – disse, Girão que votou contra o requerimento de
urgência.
Postura que foi criticada por
senadores governistas. Randolfe Rodrigues (PT-AP) classificou a manifestação
para adiar a votação como “movimento protelatório”.
– Todo o Plenário sabia do
projeto. Todo o Plenário tinha a possibilidade e a oportunidade de ir à
comissão para debater. Acabou de ser aprovado por unanimidade na comissão, com
a recomendação para votarmos agora. Eu entendo alguns que resistem em regular algumas
coisas na internet, mas me parece que está em curso um movimento protelatório
que esconde o sentimento real, que é não ter regulação nenhuma sobre a
inteligência artificial.
Mas Jorge Seif discordou da
afirmação de Randolfe.
– Não é movimento protelatório
coisa nenhuma, simplesmente para eu votar com consciência, alinhado com o que
eu acredito e com o que o Brasil espera, eu preciso ler e me debruçar. O nosso
trabalho é este: ler e trabalhar e votar “sim” ou “não”.
O presidente da comissão, senador
Carlos Viana (Podemos-MG), fez questão de tranquilizar os senadores que
manifestaram desconfiança no regramento e garantiu que o texto não representa
um instrumento para suprimir a liberdade de expressão.
– A todos que colocam suas
dúvidas pertinentes, naturalmente democráticas, quero dizer que, como
jornalista que sou, como professor universitário, 23 anos de experiência nessa
área, que a minha primeira preocupação é com a liberdade de expressão e com o direito
à informação, que estão lá constantes no nosso texto. Mas também é preciso
colocarmos com muita clareza a responsabilidade daqueles que divulgam
informações, principalmente os criadores da inteligência artificial. Que os
senadores leiam o texto, que os assessores procurem entender.
Diante das manifestações, Rodrigo
Pacheco enfatizou a relevância de se avançar numa legislação que ofereça
respaldo jurídico e segurança no que tange ao uso e desenvolvimento da IA no
país, e reforçou a construção do acordo para a votação da matéria em Plenário.
Ele confirmou o projeto como item da pauta da próxima terça-feira.
– Nós sempre adotamos
requerimentos de urgência e, em muitos casos, inclusive, votando o projeto no
próprio dia por acordo de Plenário. E em alguns projetos, inclusive, de
interesse de Vossa Excelência [Eduardo Girão], em que nós fizemos prevalecer o
acordo sobre o comando do Regimento, o que é conhecido pela Presidência das
duas sessões. Nesse caso, foi submetido também à apreciação do Plenário o
acordo em relação ao procedimento. A minha intenção era votar na data de hoje o
projeto, e, atendendo a reclames, nós propusemos o acordo da votação do
requerimento de urgência na data de hoje e a inclusão na pauta de terça-feira – respondeu o presidente da Casa.
Avanços
Para grande parte dos senadores
que iniciaram o debate sobre o tema no Plenário, o relatório aprovado na
comissão pode não ser perfeito, mas atende a uma série de preocupações de
diversos segmentos que participaram ativamente da construção do texto e das
audiências públicas.
– Mas quero dizer aos nossos
pares, em especial àqueles que estavam muito preocupados com esse processo e
que nos delegaram a possibilidade de fazer essa negociação, que nós já
conseguimos bons termos dentro do projeto. Não estou dizendo que ele está perfeito,
não estou dizendo que ele não pode ser melhorado, mas estou dizendo que ele
avançou bastante. Dou aqui o meu testemunho de que ele avançou bastante com a
ajuda de todos – disse, Rogério Marinho (PL-RN).
De acordo com o relator do
projeto, Eduardo Gomes, a pior situação é a falta de regulação, que, segundo
ele, permite a interpretação do acaso, fazendo com que crimes cometidos com o
uso da ferramenta sejam propagados cada vez mais.
– Mas é importante dizer que este
texto, depois de 520 dias, depois de todos esses debates, é o único na América
Latina em discussão e com a capacidade de dar resposta àquilo que está por trás
disso tudo que está sendo discutido. A pior regulação é a regulação ausente. A
interpretação do acaso, venha de qualquer um dos Poderes ou de qualquer setor
da sociedade, quando não abriga e não encontra lei nenhuma, encontra o ambiente
adequado para que a gente tenha a contradição da vida. O que é a contradição da
vida? É chegarmos aqui com o mérito, reclamarmos da utilização equivocada e
criminosa de imagens de criança, mas não termos sequer uma legislação para
amparar o nosso desejo.
Regulamentação
O projeto divide os sistemas de
IA em níveis de risco: risco excessivo e de alto risco para oferecer uma
regulamentação diferenciada, dependendo do impacto do sistema na vida humana e
nos direitos fundamentais.
Após muitos debates, o relatório
aprovado na comissão excluiu da lista de sistemas de IA considerados de alto
risco os algoritmos das redes sociais. Um dos temas que levantou mais
divergência entre governistas e oposição.
Além disso, o texto estabelece
que conteúdos protegidos por direitos autorais poderão ser utilizados em
processos de mineração de textos para o desenvolvimento do sistema de IA por
instituições de pesquisa, jornalismo, museus, arquivos, bibliotecas e organizações
educacionais. No entanto, o material precisa ser obtido de forma legítima e sem
fins comerciais. (Agência Senado).
Foto: Roque Sá/Agencia Senado