Em ofício ao Supremo Tribunal Federal (STF), o juiz Sérgio
Moro, que conduz a Lava Jato na 13ª Vara Federal de Curitiba, pediu [escusas] à
Corte e disse que a divulgação de áudios do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva não teve intuito [político-partidário]. A manifestação foi encaminhada ao
ministro Teori Zavascki, que solicitou esclarecimentos a Moro ao determinar a
remessa de todo o material das conversas de Lula ao Supremo.
[O levantamento do sigilo não teve por objetivo gerar fato
político partidário, polêmicas ou conflitos, algo estranho à função
jurisdicional, mas, atendendo ao requerimento do MPF, dar publicidade ao
processo e especialmente a condutas relevantes do ponto de vista jurídico e
criminal do investigado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que podem
eventualmente caracterizar obstrução à Justiça ou tentativas de obstrução à
Justiça], escreveu o juiz.
Na peça, Moro admite que pode ter [se equivocado em seu
entendimento jurídico] ao dar publicidade ao material, mas comenta cada uma das
gravações divulgadas e justifica sua decisão. [Ainda que este julgador tenha se
equivocado em seu entendimento jurídico e admito, à luz da controvérsia então
instaurada que isso pode ter ocorrido, jamais, porém, foi a intenção desse
julgador, ao proferir a aludida decisão de 16/03, provocar polêmicas, conflitos
ou provocar constrangimentos, e, por eles, renovo minhas respeitosas escusas a
este Egrégio Supremo Tribunal Federal], escreveu Moro.
Em 31 páginas, Moro argumenta que a interceptação telefônica
estava amparada na lei e tinha [foco exclusivo] nas condutas de Lula e outras
pessoas que não possuem foro privilegiado. Segundo o juiz, os diálogos do
ex-presidente com autoridades que possuem foro privilegiado, como a presidente
Dilma Rousseff, foram [colhidos fortuitamente]. A divulgação, segundo ele, só
foi feita com relação ao material que possui conteúdo [jurídico-criminal
relevante] por revelarem tentativas de Lula obstruir a justiça. Moro argumenta
ainda que não há provas de que qualquer autoridade com foro privilegiado
grampeada nas conversas tenha atendido solicitação do petista para interceder
junto à Justiça.
Ele diz ter agido, na condução dos processos sobre a Lava
Jato, [em geral, com cautela e prudência] e informa o STF que não havia
qualquer pedido de decretação de prisão cautelar de Lula [mesmo no caso
envolvendo o ex-Presidente, apesar de todo esse contexto acima exposto, de
aparente intimidação, obstrução e tentativas de influenciar indevidamente
magistrados].
Na quinta-feira, o plenário do Supremo Tribunal Federal deve
analisar a decisão de Teori Zavascki que ordenou que Moro remetesse o material
à Corte. Ontem, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, encaminhou
parecer ao STF na qual alega que a posse de Lula na Casa Civil é válida, mas
pede a manutenção das investigações com Moro.
[Entendeu este Juízo que, nesse contexto, o pedido do MPF de
levantamento do sigilo do processo se justificava exatamente para prevenir
novas condutas do ex-Presidente para obstruir a Justiça, influenciar
indevidamente magistrados ou intimidar os responsáveis pelos processos
atinentes ao esquema criminoso da Petrobrás], escreveu Moro. O juiz informou a
Zavascki que é praxe levantar o sigilo sobre interceptações telefônicas após o
encerramento das diligências, para garantir publicidade ao processo.
Dilma ? Ao Supremo, Moro afirmou que não há indicativos de
que as autoridades com foro privilegiado que aparecem em conversas com Lula ?
como a presidente Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa ?
tenham concordado com tentativas do ex-presidente de obter influência junto à
Justiça.
O juiz afirmou que o foco da investigação era o ex-presidente
da República e disse que [não parece que era tão óbvio assim] que o diálogo com
Dilma poderia ser relevante juridicamente para a presidente. Na conversa, a
presidente diz a Lula que enviaria o termo de posse como ministro da Casa Civil
antes da cerimônia na qual o petista assumiria o cargo.
[Quanto ao conteúdo, da mesma forma que os demais, entendeu
este julgador que ele tinha relevância jurídico-criminal para o ex-Presidente,
já que presente a apuração se a aceitação por ele do cargo de Ministro Chefe da
Casa Civil teria por objetivo obter proteção jurídica contra as investigações.
Considerando que a investigação tinha por foco condutas supostamente criminais
do ex-Presidente e o conteúdo, na perspectiva criminal, juridicamente relevante
do diálogo para ele, entendi que não haveria óbice na interceptação e no
levantamento do sigilo. No momento, de fato, não percebidos eventuais e
possíveis reflexos para a própria Exma. Presidenta da República], escreveu
Moro.
Mais diálogos ? Moro informou ao STF que há uma [quantidade
bem maior de diálogos interceptados] e que não foram divulgados e permanecem em
sigilo. O material será remetido [em mãos e com as cautelas devidas] ao STF,
segundo o juiz. [Não seria correto, portanto, afirmar que os diálogos foram
juntados ao processo sem o maior cuidado], escreveu Moro. Constam nestes
áudios, segundo o juiz, conversas com outro advogado que não é investigado,
além de conversas de [índole eminentemente privada].
Sobre a interceptação de Roberto Teixeira, advogado de Lula,
Moro justifica que ele é supostamente investigado por participar do processo de
compra do sítio de Atibaia. [Se o advogado se envolve em condutas criminais, no
caso suposta lavagem de dinheiro por auxiliar o ex-Presidente na aquisição com
pessoas interpostas do sítio em Atibaia, não há imunidade à investigação a ser
preservada, nem quanto à comunicação dele com seu cliente também investigado],
escreveu o juiz. (AE)
Foto:Fabio Ricardo Pozzebom