Na semana em que a Câmara dos Deputados tem prevista a
votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff, o procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, tem em sua mesa a definição sobre um pedido de
investigação da presidente por participar das tentativas de
“tumultuar” as investigações da Lava Jato.
O grupo de trabalho do procurador-geral se debruça nos
próximos dias sobre o que chamam de “arquitetura” da investigação.
Com todo o material nas mãos, a palavra final será dada por Janot, que se
manteve afastado do gabinete na última semana em licença médica.
Procuradores que trabalham com Janot veem indícios para
pedir investigações do senador Aécio Neves (PSDB-MG), do ministro da Educação,
Aloizio Mercadante, e do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), por exemplo. O
ex-líder do governo Delcídio Amaral (sem partido-MS) citou nos depoimentos mais
de 70 pessoas, com uma lista extensa de políticos.
A previsão é de que ainda nesta semana sejam encaminhados ao
Supremo Tribunal Federal (STF) os pedidos de abertura de inquérito ou
arquivamento de cada um dos 20 fatos separados pela PGR, com base na delação de
Delcídio, que já estão em fase final na Procuradoria Geral da República (PGR).
Desde a delação do petista, procuradores já avaliam a
possibilidade de um inquérito contra a presidente, o que ganhou força com o
avanço da operação sobre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a chegada
à PGR do material obtido nos grampos telefônicos.
Com relação à obstrução de investigações, a ideia é trazer
para o campo criminal o parecer assinado pelo procurador-geral e encaminhado ao
STF anteontem. Na peça, Janot diz que a nomeação de Lula para a Casa Civil por
Dilma faz parte do “cenário” em que foram identificadas diversas
tentativas de atrapalhar as investigações criminais da Lava Jato e vê no ato
uma forma de “tumultuar” e atrasar a investigação. Por
“coerência”, dizem fontes com acesso ao caso, a definição sobre o
eventual inquérito de Dilma deve seguir a mesma premissa.
Para formarem o pedido de investigação, procuradores devem
unir três materiais: a delação de Delcídio, as conversas por telefone
interceptadas pela Lava Jato e as investigações em andamento sobre Lula. Na
delação, Delcídio citou por exemplo uma investida do Planalto sobre o
Judiciário para influir nas investigações com a suposta indicação do ministro
do Superior Tribunal de Justiça Marcelo Navarro Ribeiro Dantas.
Já as implicações sobre Lula podem ser cruciais para os
desdobramentos criminais com relação a Dilma. Isso porque o crime de embaraço
às investigações prevê a tentativa de atrapalhar apuração de infrações penais
que envolvam organização criminosa. É necessário apontar, portanto, que há
indícios de envolvimento de Lula em uma organização criminosa para enquadrar o
ato da presidente de nomeação do petista no crime de obstrução. Por isso, o
material sobre o tríplex no Guarujá e o sítio em Atibaia, ambos supostamente
pertencentes ao ex-presidente, serve de apoio à definição sobre Dilma.
Em março de 2015, Janot descartou a possibilidade de
investigar a presidente mesmo após menção ao nome de Dilma por delatores. Pela
Constituição, alegou o procurador, não cabe investigação de presidente da
República durante o mandato por atos alheios ao período e à função de
presidente. Esse tipo de preliminar, no entanto, já foi descartada na PGR no
caso dos óbices à investigação.
O “cenário” das tentativas de obstrução é formado
também por conversas laterais grampeadas que envolvem o Planalto, como diálogo
em que o presidente do PT sugere ao então ministro da Casa Civil, Jaques
Wagner, um pedido de ajuda para evitar a prisão de Lula.Independentemente da
definição do plenário do Supremo sobre a validade da posse de Lula, o
ex-presidente será investigado perante a Corte. Os procuradores suspeitam da
prática de crimes pelo petista que têm conexão com investigações que envolvem
pessoas com foro privilegiado. É o caso da suspeita, levantada por Delcídio, de
que Lula seja o mandante de pagamentos à família de Nestor Cerveró para calar o
ex-diretor da Petrobrás.
Em delação, Delcídio afirmou que Lula solicitou ajuda para o
amigo e pecuarista José Carlos Bumlai, que estaria implicado nas delações de
Cerveró e do lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano. Delcídio
seria responsável, segundo declarou aos investigadores, por intermediar o
pagamento de valores à família do ex-diretor da Petrobrás com recursos de
Bumlai. Lula prestou depoimento a procuradores da Lava Jato em Brasília na
quinta-feira sobre o assunto. (AE)