A decisão do Senado de cassar o mandato da presidente Dilma
Rousseff, mas manter seus direitos políticos, terá consequências no julgamento
do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), cujo mandato pode ser interrompido na
Câmara por quebra de decoro parlamentar, em votação marcada para 12 de
setembro. Anunciada na sessão final do impeachment, a interpretação do
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, de
fatiar a decisão em duas, para votação separadamente – uma, cassar o mandato de
Dilma; a outra, suspender seus direitos políticos ? também será utilizada pelos
aliados de Cunha para tentar livrar o parlamentar da perda dos direitos
políticos por oito anos após sua cassação.
O líder do PMDB no Senado, Eunício de Oliveira (CE), nega
que a orientação do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), a favor da
manutenção dos direitos políticos de Dilma faça parte de um acordo com outras
legendas para livrar Cunha de ficar sem poder participar de eleições ou ocupar
cargos públicos depois de cassado (veja depoimento no vídeo abaixo). Mas vários
parlamentares de diversos partidos consultados pelo Congresso em Foco são
unânimes ao garantir que a mesma interpretação será requerida pelos aliados de
Cunha na Câmara.
A orientação de Renan no plenário em defesa da tese reflete
a costura política do PMDB com outras legendas para evitar que Cunha passe oito
anos sem poder ocupar nem concorrer a cargos públicos. A solução definida pelos
senadores nesta quarta-feira (31) atende aos apelos do PT, que implorou ao
plenário pela manutenção dos direitos de Dilma. Os petistas, em troca, não
fariam carga para que Cunha, além de cassado, perca seus direitos políticos.
Mesmo considerada uma nova variedade de jabuticaba jurídica
no ordenamento legal do país, a decisão do Senado poderá ajudar a acalmar
Cunha. Em vários momentos desde que começou a ser julgado por quebra de decoro
no Conselho de Ética da Câmara, Cunha ameaçou delatar seus antigos aliados,
inclusive o presidente Michel Temer.
[Esta solução pode nos ajudar a acalmar Eduardo e evitar
problemas maiores para o governo Temer], disse um aliado do governo e amigo do
deputado fluminense.
A interpretação comum entre senadores e deputados de todos
os partidos é que, com a decisão do Senado de manter os direitos políticos de
Dilma, ela poderá ser nomeada para qualquer cargo público e até disputar
eleições, inclusive para a própria Presidência da República. O mesmo ocorreria
com Eduardo Cunha. Ele seria cassado ainda neste ano e voltaria a concorrer, em
2018, a qualquer um dos cargos em disputa – de deputado estadual ao Palácio do
Planalto.
O PSDB não topa cassar Eduardo Cunha e manter seus direitos
políticos, como quer o PMDB. Os tucanos manterão a mesma interpretação
derrotada no plenário do Senado na sessão final do impeachment de que a
cassação do mandato implica perda dos direitos políticos. Parte das cúpulas e
das bancadas do PSD e do PP, que também fazem parte da base de apoio ao governo
Temer, é contra manter os direitos políticos de Cunha. A fórmula encontrada
pelo Senado de cassar o mandato de Dilma e manter seus direitos políticos – com
reflexos no caso Cunha – é uma solução parlamentarista dentro de um modelo presidencialista
sem paralelo.
Leonel Rocha | Congresso em Foco