O ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal
(STF), negou nesta segunda-feira (10) interromper o andamento na Câmara da
proposta de emenda à Constituição que estabelece um teto de gastos federais,
como pediam deputados do PC do B e do PT (leia a decisão ao final desta
reportagem).
Tratada pelo Palácio do Planalto como prioridade para
reequilibrar as contas públicas, a PEC do teto de gastos limita pelas próximas
duas décadas o aumento das despesas do governo federal à inflação do ano
anterior.
No entanto, o projeto estabelece que, a partir do décimo
ano, o governo poderá apresentar outra base de cálculo, podendo desvincular o
crescimento das despesas da inflação.
Na ação, os parlamentares argumentavam que a proposta, se
aprovada, restringiria o poder do Legislativo e do Judiciário para aumentar
seus orçamentos.
O pedido também apontava limitação dos deputados federais
que se elegerão no futuro para deliberar sobre a destinação dos recursos
públicos, na votação das leis orçamentárias anuais, inclusive para concessão de
aumento a servidores públicos.
Para Barroso, que relatou o pedido da oposição, uma
intervenção do Judiciário só se justificaria se houvesse clara violação de
cláusula pétrea (dispositivos que não podem ser alterados por meio de emenda na
Constituição), o que não ficou demonstrado, segundo o ministro.
A ação da oposição ainda terá que passar por julgamento de
mérito no plenário do Supremo, o que não tem data para acontecer. O ministro
Barroso, relator do caso, ainda ouvirá as partes envolvidas, como a Presidência,
a Advocacia Geral da União, Câmara, Senado e Procuradoria Geral da República.
Segundo a decisão do ministro, o Judiciário não pode impedir
discussões de interesse nacional.
[O Congresso Nacional, funcionando como poder constituinte
reformador, é a instância própria para os debates públicos acerca das escolhas
políticas a serem feitas pelo Estado e pela sociedade brasileira, e que
envolvam mudanças do texto constitucional. Salvo hipóteses extremas, não deve o
Judiciário coibir a discussão de qualquer matéria de interesse nacional],
afirmou o ministro na decisão.
O ministro frisou que a responsabilidade fiscal é [fundamento
das economias saudáveis] para que não sejam comprometidas as novas gerações.
[A responsabilidade fiscal é fundamento das economias
saudáveis, e não tem ideologia. Desrespeitá-la significa predeterminar o futuro
com déficits, inflação, juros altos, desemprego e todas as consequências
negativas que dessas disfunções advêm. A democracia, a separação de Poderes e a
proteção dos direitos fundamentais decorrem de escolhas orçamentárias
transparentes e adequadamente justificadas, e não da realização de gastos
superiores às possibilidades do Erário, que comprometem o futuro e cujos ônus
recaem sobre as novas gerações], disse.
Decisão
Leia abaixo a decisão do ministro Luis Roberto Barroso:
Relator: Min. Roberto Barroso
Impte.(s): Jandira Feghali e Outro(a/s)
Adv.(a/s): Paulo Machado Guimarães
Impdo.(a/s): Presidente da Câmara dos Deputados
Adv.(a/s): Advogado-geral da União
DECISÃO:
Ementa: Direito constitucional.
Processo legislativo. Mandado de segurança. Proposta de Emenda Constitucional.
Novo regime fiscal. Pedido de sustação da tramitação, por violação de cláusula
pétrea.
1. O controle de
constitucionalidade de emendas constitucionais tem caráter excepcional e exige
inequívoca afronta a alguma cláusula pétrea da Constituição. Mais excepcional
ainda é o controle preventivo de constitucionalidade, visando a impedir a
própria tramitação de proposta de emenda constitucional.
2. O Congresso
Nacional, funcionando como poder constituinte reformador, é a instância própria
para os debates públicos acerca das escolhas políticas a serem feitas pelo
Estado e pela sociedade brasileira, e que envolvam mudanças do texto
constitucional. Salvo hipóteses extremas, não deve o Judiciário coibir a
discussão de qualquer matéria de interesse nacional.
3. Por significarem
severa restrição ao poder das maiorias de governarem, cláusulas pétreas devem
ser interpretadas de maneira estrita e parcimoniosa. Não há, na hipótese aqui
apreciada, evidência suficiente de vulneração aos mandamentos constitucionais
da separação de Poderes, do voto direto, secreto, universal e periódico e dos
direitos e garantias individuais.
4. A responsabilidade
fiscal é fundamento das economias saudáveis, e não tem ideologia.
Desrespeitá-la significa predeterminar o futuro com déficits, inflação, juros
altos, desemprego e todas as consequências negativas que dessas disfunções
advêm. A democracia, a separação de Poderes e a proteção dos direitos
fundamentais decorrem de escolhas orçamentárias transparentes e adequadamente
justificadas, e não da realização de gastos superiores às possibilidades do
Erário, que comprometem o futuro e cujos ônus recaem sobre as novas gerações.
5. Por certo, há risco
de setores mais vulneráveis e menos representados politicamente perderem a
disputa por recursos escassos. Porém, esta não é uma questão constitucional,
mas política, a ser enfrentada com mobilização social e consciência cívica, e
não com judicialização.
6. Medida liminar
indeferida.
Mariana Oliveira – Da TV Globo, em Brasília
Foto: Marcelo Camargo ABR