Bolsonaro recebe presidente autoproclamado da Venezuela e prega [democracia e eleições limpas]

Em mais um capítulo dos reflexos da crise da Venezuela no
Brasil, o presidente Jair Bolsonaro
recebeu no Palácio do Planalto o autoproclamado presidente
venezuelano, Juan
Guaidó
, em mais uma tentativa de pressão diplomática contra o regime
de Nicolás
Maduro
. Em pronunciamento ao lado de Guaidó, Bolsonaro voltou a
demonstrar comprometimento com o líder da oposição a Maduro – que preside,
na  Venezuela,
o que equivale ao Congresso brasileiro – e a defender a realização de [eleições
limpas].

[Nós não pouparemos esforços – dentro, obviamente, da
legalidade, da nossa Constituição e de nossas tradições – para que a democracia
seja restabelecida na Venezuela. E todos nós sabemos que isso será possível
através não apenas de eleições, mas de eleições limpas e confiáveis], discursou
o chefe de Estado brasileiro.

Guaidó se pronunciou antes de Bolsonaro, em discurso
afinado com o anfitrião, defendeu a natureza constitucional de sua [luta] por
democracia e liberdade no país vizinho. Para o venezuelano, o encontro no
Palácio do Planalto conota [novo começo] na relação bilateral Brasil-Venezuela.
Do lado de fora da sede da Presidência da República, na Praça dos Três Poderes,
manifestantes contra Guaidó enfrentaram o tempo chuvoso na capital federal na
tarde desta quinta-feira (28).

O encontro entre Bolsonaro e Guaidó no Palácio do Planalto
dá ares oficiais a uma visita que teria caráter pessoal. A jornada do
venezuelano teve início na madrugada desta quinta-feira (28), na base aérea de
Brasília, e teve entre os primeiros compromissos uma reunião não oficial no
Ministério das Relações Exteriores. O périplo incluiu ainda uma reunião com o
presidente do Senado (e do Congresso), Davi Alcolumbre (DEM-AP).

A crise no país vizinho chegou aos limites da intervenção
militar multilateral – pretensão encabeçada pelos Estados Unidos, que tem
interesses no petróleo venezuelano – e da ameaça do conflito armado neste fim
de semana, após Maduro fechar
as fronteiras
 com o Brasil e a Colômbia a partir das 20h da última
sexta-feira (22). Desde o ano passado, com a redefinição da geopolítica
regional na América Latina após o impeachment de Dilma Rousseff, em agosto de
2016, Maduro tem se afastado do Brasil diplomaticamente.

O presidente venezuelano, reeleito em maio de 2018 para mais
seis anos de mandato, tem ordenado retaliações e demais medidas diplomáticas
austeras contra países vizinhos desde que, além de Argentina e de outras nações
sul-americanas, a maioria das nações do continente se alinhou aos Estados
Unidos na disposição de contestar a legitimidade de Maduro como presidente. Os
países contra o regime bolivariano de Maduro já chegaram a cogitar a expulsão
da Venezuela do Mercosul, mas a disposição pode ser alterada caso Guaidó assuma
o comando do país definitivamente.

Em grave crise política que se desenrola há meses, a
Venezuela enfrenta embargos norte-americanos e vê sua economia enfraquecer sem
solução à vista. Confrontos entre oposicionistas e apoiadores de Maduro, que
conta com o apoio das forças armadas venezuelanas, passaram a ser constantes,
de modo que a situação se desdobrou em êxodo. Nos últimos meses, centenas
de milhares de cidadãos venezuelanos migraram para países vizinhos – no Brasil,
Roraima é a principal porta de entrada.

Além do governo brasileiro e dos demais supracitados, Guaidó
conta com o apoio de países como Argentina, Canadá, Alemanha e a maioria dos
países europeus. Mas, por outro lado, ele não é reconhecido por duas das mais
poderosas nações, China e Rússia, ambas com grande poderio bélico e alinhadas
estratégica e ideologicamente a Maduro. Países como México, Cuba e Irã também
apoiam o sucessor do líder bolivariano Hugo Chávez (1954-2013), em um
grupo que reúne menos países.

Ofensiva militar

Para piorar ainda mais a relação com o país vizinho, o
Brasil tomou uma decisão inédita relacionada à ofensiva militar norte-americana
– por mais de uma vez o presidente dos EUA, Donald Trump, sugeriu uma
intervenção militar na Venezuela, ao que Maduro responde com ameaça de reação à
altura. Pela primeira vez na história, o governo Bolsonaro vai mandar um militar
brasileiro para integrar o Comando Sul das forças armadas norte-americanas.

A novidade, uma vez que há militares brasileiros em missões
mundo afora, é que o general destacado será o subcomandante do exército de uma
outra nação, algo inédito. E, nesse caso, de um país que prepara uma ação
militar em regiões de fronteira do Brasil. E sem a prévia comunicação ao
Congresso brasileiro.

[Essa adesão brasileira só foi conhecida porque um almirante
americano que foi prestar contas do Comando Sul ao Senado dos Estados Unidos
disse, muito satisfeito, ter conseguido que o Brasil aceitasse o convite. É
isso mesmo. Foi o Congresso americano, e não o brasileiro, que foi informado
pela primeira vez que haverá um general brasileiro na cadeia de comando do
exército americano. É uma decisão estratégica que os parlamentares brasileiros
deveriam ter aprovado, mas não foram nem mesmo consultados], explica a
jornalista Maria Cristina Fernandes, do jornal Valor Econômico,
responsável pela publicação da notícia em primeira mão. (Congresso em Foco)

Foto: Marcos Corrêa / PR