No STF, PGR defende uso de dados bancários e fiscais sem crivo de juiz

O procurador-geral da República, Augusto Aras (à esquerda na
foto), defendeu hoje (20), no Supremo Tribunal Federal (STF), a
comunicação direta de informações sobre movimentações fiscais e financeiras
suspeitas ao Ministério Público Federal (MPF).

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) começou na
manhã desta terça-feira (20) a julgar se órgãos de controle podem
compartilhar dados com autoridades de investigação sem a necessidade de
autorização judicial. No fundo, os ministros debatem se isso violaria ou não o
sigilo bancário e fiscal. O julgamento foi suspenso para almoço e deve ser
retomado após as 14h com o voto do relator do tema, ministro Dias Toffoli.

Em sustentação oral, Aras argumentou que os relatórios de
órgãos de controle, como a Unidade de Inteligência Financeira (UIF, antigo
Conselho de Controle de Atividades Financeiras, o Coaf) e a Receita Federal,
não constituem prova de nenhum crime, sendo somente dados primários a indicarem
possíveis linhas de investigação. Por isso, não haveria de se falar em quebra
de sigilo no acesso a tais dados.

Para o PGR, haveria além disso uma impossibilidade prática
em submeter todas as comunicações sobre movimentações suspeitas ao escrutínio
de um juiz, ante o grande volume de informações. Somente na UIF, são 15 mil
comunicações diárias, ressaltou ele.

Aras também frisou que o sistema de comunicação direta, por
órgãos de controle e inteligência, de movimentações suspeitas a autoridades de
investigação é o procedimento adotado em 184 países, e que restringir tal
sistema traria ?problemas para o Brasil se justificar perante a comunidade internacional?,
ocasionando inclusive obstáculos para que brasileiros tenham acesso a mercados
financeiros internacionais.

?Corremos o grave risco de o Brasil vir a ser considerado
tecnicamente um paraíso fiscal, mácula excessivamente nociva a um país que
necessita retomar o curso do crescimento econômico e estabelecer o bem-estar
social?, disse o PGR.

IBCCrim

Na condição de amigo da corte (amicus curiae), o
advogado e jurista Gustavo Badaró falou da tribuna em nome do Instituto
Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim). Ele defendeu que o compartilhamento
com autoridades de investigação de dados sigilosos obtidos por órgãos de
controle deve ser submetido a um prévio exame de “necessidade, adequação e
proporcionalidade” por parte de um juiz.

Badaró argumentou que o tema diz respeito à proteção da
privacidade e da intimidade dos indivíduos, tema que ganha relevância em tempos
digitais, em que o número de informações aumenta exponencialmente em termos
tanto quantitativos como qualitativos.

Ele sustentou que relatórios da UIF, por exemplo, trariam
informações ainda mais detalhadas que um extrato bancário. Para Badaró, por
esse motivo o órgão que tem acesso direto a tais dados não pode ser o mesmo que
tem o poder de apresentar denúncias criminais, pois essa seria a única maneira
de evitar possíveis abusos de autoridade.

“Não se está a defender obstaculizar a persecução penal.
Longe disso. O que se está é apenas a exigir que, para quem tem poderes
concretos de persecução, que o acesso mais detalhado, mais restrito, ou a camadas
mais profundas de informações que digam respeito à privacidade passe pela
devida intermediação judicial”, disse Badaró.

Entenda

Hoje, a praxe é que órgãos de controle como a Receita
Federal e a Unidade de Inteligência Financeira (UIF) enviem ao Ministério
Público Federal (MPF) relatórios sobre movimentações atípicas, que podem
indicar atividade ilícita.

No caso concreto, os ministros julgam o recurso do MPF
contra a anulação, pela segunda instância da Justiça, de uma
condenação por sonegação fiscal do dono de um posto de gasolina em São Paulo. A
investigação teve início em um relatório do Fisco repassado diretamente aos
procuradores.

O Supremo já firmou que a decisão sobre o caso terá
repercussão geral. Isso significa que ao final do julgamento será firmada uma
tese a ser seguida por todos os tribunais do país em processos do tipo.

O advogado do posto de gasolina, alvo do processo no caso
concreto, não se inscreveu para realizar sustentação oral. (Felipe Pontes
? Agencia Brasil).

Foto: Nelson Jr./SCO/STF