O presidente Jair Bolsonaro (PL)
anunciou, nesta quinta-feira (21/4), que assinou um decreto de “graça
constitucional” ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ). “Um decreto que
vai ser cumprido”, disse Bolsonaro, em uma transmissão ao vivo nas redes
sociais.
Na prática, o decreto de indulto
perdoa os crimes cometidos pelo parlamentar. O ato, segundo o presidente, deve
ser publicado em edição extra do Diário Oficial da União (DOU).
“É uma notícia de extrema
importância para a nossa democracia e a nossa liberdade. É um documento que eu
comecei a trabalhar desde ontem, quando foi anunciada a prisão de 8 anos e 9
meses ao deputado federal Daniel Silveira”, afirmou.
Procurado, o Supremo Tribunal
Federal (STF) disse que não vai se manifestar sobre a decisão de Bolsonaro.
A graça é um perdão concedido
pelo Presidente da República e está prevista no artigo 107, inciso II do Código
Penal. Ela prevê o favorecimento de um condenado por crime comum ou por
contravenção. Extingue ou diminui a pena imposta.
No entanto, ministros do Supremo
e juristas têm entendimentos diferentes. Parte deles sustenta que graça ou
indulto só podem ser aplicados para condenado com pena transitada em julgado.
Não é o caso do deputado Daniel Silveira.
O indulto só se aplica à
punibilidade, ou seja, à pena de 8 anos e nove meses de prisão. A
inelegibilidade de Daniel Silveira e a perda de mandato estão mantidos.
O advogado criminalista e
professor da FGV-SP Celso Vilardi acredita que a atitude do presidente pode
gerar uma crise institucional, porque o Supremo “foi duro e coeso decidindo por
punir Daniel Silveira”. “Há o perigo de uma crise institucional. O indulto
[porém] é uma prerrogativa constitucional do presidente. Não vejo nada que
possa mudar essa situação. É uma extinção da punibilidade. O indulto tem o
condão de extinguir o punibilidade. Acaba com a ação penal”, afirmou.
Também criminalista, o advogado
Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, ressaltou que a atribuição do
presidente é constitucional, porém pouco usual no Brasil. “Acontece muito nos
Estados Unidos. Ele extingue a pena, mas mantém Daniel Silveira inelegível. Não
lembro de atitude igual no Brasil”, analisou.
O julgamento de Silveira no STF
ocorreu na tarde dessa quarta-feira (20/4). Ele foi condenado a 8 anos e 9 meses de prisão em regime
fechado por estímulo a atos antidemocráticos e ataques a ministros do
tribunal e instituições como o próprio Supremo.
Durante o julgamento, o relator
do caso, o ministro Alexandre de Moraes, também estabeleceu a perda do mandato
e dos direitos políticos de Silveira e uma multa de R$ 200 mil. Nove ministros
acompanharam o voto de Moraes. O único a votar pela absolvição do parlamentar
foi Kassio Nunes Marques.
O primeiro efeito da condenação é
a inelegibilidade. Ela será reconhecida judicialmente se e quando Daniel
Silveira pedir registro de uma candidatura. Quanto à perda do mandato, o
Supremo, depois do trânsito em julgado da ação, vai comunicar a decisão para a
Câmara dos Deputados, onde deve ser procedido o trâmite interno. O presidente
Arthur Lira (PP-AL) defende que a perda de mandato seja discutida pelos
deputados. A prisão também não ocorre de imediato, porque ainda cabe recurso.
Acusação
Daniel Silveira é aliado de Jair
Bolsonaro e dos filhos do presidente. O deputado foi acusado pela
Procuradoria-Geral da República (PGR) de coação no curso do processo, incitação
à animosidade entre as Forças Armadas e o Supremo Tribunal Federal, e tentativa
de impedir o livre exercício dos poderes da União.
Durante o julgamento, a
vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, citou diversos crimes
cometidos por Silveira e disse que as falas e ameaças contra instituições foram “vexatórias”, “inaceitáveis” e de “afronta à democracia”.
“Não se pode permitir que a força
ou violência contra membros de instituições essenciais possam ser legitimamente
concedidas no espaço público. Inviolabilidade do parlamentar não alcança, a
despeito dos termos abrangentes, o apelo à violência, declarações carregadas de
grave ameaça”, afirmou Lindôra.
Defesa
A defesa de Silveira foi feita
pelo advogado Paulo Faria. Durante o julgamento, ele disse que o parlamentar é
algo de um “julgamento político”.
“Se aconteceram excessos
pessoais, eu entendo que a deve-se respeitar o princípio acusatório. O juiz não
pode ser o julgador e vítima. O caminho seria representação por calúnia e
difamação. Não há que se falar de coação no processo, porque não houve”,
afirmou o advogado.
Nas alegações finais, Faria ainda
defendeu a existência de nulidades processuais, como o não oferecimento de
acordo e a extinção do crime no que se refere à incitação à animosidade entre
as Forças Armadas e o Supremo, e à prática de crimes contra a segurança
nacional.
Histórico
Daniel Silveira virou réu em
abril do ano passado no inquérito que apura atos antidemocráticos. Em fevereiro
de 2021, por ordem do ministro Alexandre de Moraes, ele foi preso por ter
publicado um vídeo no qual defende o AI-5 – o instrumento de repressão mais
duro da ditadura militar – e a destituição dos ministros do Supremo Tribunal
Federal. As incitações feitas pelo deputado são inconstitucionais.
Durante a investigação, o
deputado foi alvo de outro pedido de prisão e medidas restritivas, uma vez que
ele descumpriu ordens judiciais ao deixar de usar tornozeleira eletrônica e se
comunicar com outros investigados do inquérito.
Em março deste ano, Moraes
determinou que o deputado voltasse a usar tornozeleira eletrônica. Silveira se
recusou a cumprir a medida. Só depois que o ministro do STF determinou o
pagamento de uma multa diária de R$ 15 mil e bloqueio das contas do
parlamentar, é que Silveira cumpriu a ordem judicial. (Mayara Oliveira – Metrópoles)
Foto: DIvulgação/Metrópoles