O governo lançou, ontem, um
programa que disponibilizará R$ 300 bilhões, até 2026, em investimentos para
promover a retomada da indústria nacional, que tem como maiores adversários o
quadro crônico de estagnação e a perda de competitividade em relação ao
produtos importados – sobretudo da China -, que conseguem combinar preço e
qualidade atraentes para o consumidor. O Nova Indústria Brasil, porém, traz de
volta medidas de antigas gestões petistas ? como os subsídios e uma política de
obras e compras públicas que incentiva os fabricantes do mercado interno.
A maior parte dos recursos virá
via financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES), mas, cerca de 25% (R$ 77,5 bilhões) já foram investidos em 2023. No
lançamento do programa, segundo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
“se dinheiro não é problema, então temos que resolver as coisas com muito
mais facilidade”.
Lula é defensor de que o Estado
atue no incentivo à indústria. Para ele, trata-se de uma medida necessária para
se “superar, de uma vez por todas, o problema de o Brasil não ser,
definitivamente, um país grande e desenvolvido. Estamos sempre na beira, mas
nunca chegamos lá”.
“Tínhamos chegado a ser a
sexta economia (mundial), recuamos para a 12ª. Agora, voltamos para a 9ª
(posição), mas não é porque crescemos muito. É porque as outras (economias)
caíram. Isso não é motivo de orgulho”, salientou Lula, comentando o resultado
positivo na economia no primeiro ano do atual governo.
Segundo o presidente, a única
forma de garantir um crescimento econômico sustentável é por meio da
reindustrialização, que deve ter participação do financiamento público. “É
muito importante o Brasil voltar a ter uma política industrial inovadora, digitalizada.
Que a gente possa vencer a situação de o Brasil nunca ser um país
industrializado”, reforçou.
“Precisamos fazer com que os
empresários brasileiros acreditem no Brasil. Uma coisa que o Rui Costa
(ministro da Casa Civil) disse, e que temos que levar em conta, para que o
Brasil se torne competitivo: muitas vezes, temos que financiar aquilo que o
país quer exportar”, lembrou.
58º no mundo
O vice-presidente e ministro do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, afirmou que o Brasil
está assumindo o compromisso de desenvolver uma indústria da
“descarbonização, exportadora e competitiva”. “Um estudo mostra
que o Brasil deixou o 78º lugar na indústria do mundo. Subimos 20 posições. E
terminamos o ano passado em 58º lugar, em volume físico de produto industrial.
Claro que ainda não está bom”, cobrou.
Alckmin ressaltou que a Reforma
Tributária, aprovada no ano passado, colabora para o projeto de
reindustrialização. “Aguardada há 40 anos, desonerará completamente o
investimento e a exportação porque acaba com a cumulatividade (de tributos).
Essa é uma reforma que traz eficiência econômica, faz o PIB crescer, além da
simplificação”, observou.
Ele também enumerou as ações
previstas no plano e citou o programa que dá estímulo às empresas que sofrem
com a depreciação acelerada de maquinário. Para renovar o parque, terão redução
de imposto para se atualizarem mais rapidamente ? segundo Alckmin, esse
processo de modernização dura, em média, 15 anos.
“É importante para dar
eficiência energética e melhorar a produtividade”, afirmou o vice, que
anunciou que esse período de substituição de máquinas deve ser de dois anos.
Os R$ 300 bilhões para financiar
a retomada produtiva e a transição energética serão divididos em quatro áreas:
1ª) R$ 66 bilhões estimularão a inovação e a digitalização das indústrias
nacionais; 2ª) R$ 12 bilhões para financiamentos para descarbonização e
transição energética; 3ª) R$ 40 bilhões para o financiamento de exportações; e
4ª) R$ 182 bilhões a serem aplicados no financiamento de projetos de expansão
da produção e modernização de maquinário.
Lula também cobrou dos ministros
presentes ao lançamento que as metas estabelecidas no Nova Indústria Brasil
sejam cumpridas – e deu a incumbência a Alckmin, que coordena o programa.
“O problema não termina aqui, começa aqui. Temos mais três anos pela
frente e o objetivo me parece que é para gente chegar no final e ter algo
concreto para a sociedade falar. Discutimos, aprovamos e aconteceu”,
observou o presidente.
Insuficiente, mas um ponto de
partida
Apesar dos R$ 300 bilhões
anunciados para o Nova Indústria Brasil, o diretor da Confederação Nacional da
Indústria (CNI) e presidente do Conselho de Administração do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Rafael Lucchesi, considerou o valor
insuficiente, se comparado com o investimento dos países desenvolvidos para o
setor.
“Mas é um ponto de partida.
Não temos a realidade macroeconômica dos Estados Unidos, do Japão e da União
Europeia. R$ 300 bilhões são (aproximadamente) US$ 60 bilhões. Os EUA estão
colocando US$ 1,9 trilhão; a União Europeia, US$ 2 trilhões; a Inglaterra, US$
1,6 trilhão; o Japão, US$ 1,5 trilhão. Precisamos fazer mais”, avaliou.
Apesar das críticas de alguns
setores da economia, que consideram a política de fomento ao conteúdo nacional
uma forma de protecionismo e atraso, Lucchesi ressaltou que todos os países
fazem algo semelhante. Ele acredita que as medidas gerarão um “círculo
virtuoso de produtividade e de desenvolvimento”.
Para o diretor da CNI, o
agronegócio não consegue ter o papel de gerador de desenvolvimento semelhante
ao da indústria. “Não tem nenhuma sociedade em que a locomotiva é o
agronegócio. Nem o Brasil é assim, isso é propaganda de tevê”, afirmou.
Para o diretor da CNI, as
críticas que o governo recebe por incentivar a indústria têm base ideológica.
“Qual é o país desenvolvido que não tem uma estrutura industrial moderna?
Nenhum. De onde vem o progresso técnico da agricultura? Agricultura de precisão,
chip e satélite – isso é indústria. Vamos trazer a discussão para além da
política e da ideologia. Essa visão preconceituosa em relação à política
industrial é prejudicial”, lamentou.
Já o vice-presidente da CNI,
Leonardo de Castro, chamou a atenção para o momento decisivo no mundo em
relação ao desenvolvimento de novos instrumentos que promovam a
industrialização verde. Também presidente do Conselho Temático de Política
Industrial e Desenvolvimento Tecnológico (Copin), disse que o Brasil está
diante de uma “janela de oportunidade histórica” para
fomentar uma indústria sustentável, com menor emissão de carbono.
Para Castro, uma chance única se
abre para o Brasil com os investimentos anunciados. “Desse processo, vai
emergir um novo arranjo das nações. EUA, União Europeia, Japão e Coreia do Sul,
em resposta à China, buscam ampliar suas estruturas produtivas. E se movem na
direção da descarbonização”, afirmou.
Segundo Castro, o Nova Indústria
Brasil gerará novos empregos e alinhará o país às nações desenvolvidas.
“Estamos reafirmando a opção do presidente da República de recolocar a
indústria no centro da estratégia de desenvolvimento, permitindo mais e melhores
empregos, dignidade e orgulho próprio”, salientou. (Aline Brito + Henrique
Lessa + Evandro Éboli /Correio Brasiliense).
Foto: Ed Alves/CB/DA.Press